Tecnologia Ambiental: Sabesp fecha contrato para montar estação de água potável por ultrafiltração

Está definida a primeira obra de potabilização de água por membranas de ultrafiltração do Brasil, na ETA Alto da Boa Vista, em São Paulo, da Sabesp. No final de abril, a concorrência pública da estatal decretou como vencedora a proposta da Centroprojekt do Brasil, que começará ainda neste ano a construção da unidade de 1 m3/s de água potável, voltada para a ampliação da estação da zona sul da capital atualmente responsável pelo tratamento convencional de 14 m3/s.
Contrato de R$ 52 milhões, segundo o gerente da Centroprojekt, Rogério Seródio, até o final do ano parte da estação deverá estar pronta para permitir o start-up de teste e, de forma real, apenas na entrada do segundo trimestre de 2014. O contrato inclui, além da entrega turn-key dos módulos da estação, a pré-operação por seis meses.

A tecnologia das membranas será da norte-americana Koch Membranes Technologies, uma das principais fornecedoras globais e também responsável pela tecnologia de MBR (Membrane Bio-Reactor) instalada na unidade de reúso do Aquapolo, parceria entre a Foz do Brasil e a Sabesp que abastece o polo petroquímico paulista por meio da recuperação do esgoto da ETE ABC.
O projeto contempla sete módulos com seis tanques com membranas submersas do tipo fibra oca Puron HF (High Flow), que possuem cada uma 2.650 m2 de área de filtração. Isso dará no total 11.300 m2 de área de filtração (o Aquapolo, que gera 650 l/s de água de reúso, tem ao todo 96 mil m2 de área de filtração em suas membranas).
Embora a concorrência da Sabesp tenha sido aberta para todas as tecnologias de membranas, a escolha pela tecnologia de fibra oca submersa, para especialistas da área, tem a ver com as peculiaridades do empreendimento. Em primeiro lugar, e além do espaço muito menor conseguido com a ultrafiltração, a rapidez para colocar a estação para funcionar ou para desligá-la, em virtude de sua estrutura modular, que também permite mobilidade física. Isso significa que a Sabesp pode até mudar a estação para outro local se desejar. O que, por sinal, pode até ocorrer, visto que nos próximos anos a cidade passará a contar com uma maior disponibilidade de água depois da definição da PPP São Lourenço, que trará água dessa bacia a 80 km da cidade.
Outro ponto importante para a tecnologia da Koch é o seu baixo consumo de energia, em comparação com membranas pressurizadas. A região da zona sul paulistana tem muitas quedas de energia e, se fosse uma tecnologia muito dependente do insumo, haveria a necessidade de gerador próprio, o que não ocorre com as membranas submersas.
A estação em projeto contará com as membranas e com pré-tratamento por filtros de cartucho, além de todo o sistema de bombeamento, instrumentação e sistema de limpeza química. A presente obra é considerada a primeira fase da expansão da ETA Alto da Boa Vista. Como a estação tem capacidade para captar da represa do Guarapiranga 16 m3/s, ainda há mais 1 m3/s para ser aproveitado. E provavelmente em 2014 mais uma concorrência será aberta para a elaboração de novo projeto de ultrafiltração, dando continuidade ao pioneirismo no Brasil do projeto considerado o maior da América Latina para água potável.
Riscos na água

Se depender das exigências oficiais, o monitoramento da qualidade de água distribuída por companhias de saneamento no Brasil é bastante deficiente. Basta comparar com a realidade dos Estados Unidos, por exemplo, onde há cerca de dois anos foi instituída uma legislação que obriga os distribuidores de água a monitorar mais de 80 mil contaminantes, entre eles extensa linha de fármacos, hidrocarbonetos, hormônios e várias outras substâncias. No Brasil, a lista não passa de mais de 30 e ainda assim o que realmente é exigido é a turbidez, o pH, o residual de cloro, flúor e de coliformes totais.
Essa disparidade, para especialistas, pode colocar em risco a saúde da população brasileira, principalmente no longo prazo, já que pelo menos a contaminação microbiológica é relativamente combatida pela presença de cloro na água. A preocupação tem a ver com a grande quantidade de substâncias químicas não detectáveis – e sequer pesquisadas, por não haver legislação no país – presentes nos corpos d’água utilizados para captação pelas companhias de saneamento. Basta imaginar o volume de medicamentos que toda a população consome e depois descarta por meio do esgoto, em rios e represas, os vazamentos de hidrocarbonetos por carros, por poluição difusão, postos e centrais de combustíveis e indústrias, e por aí vai. Nenhuma exigência legal faz com que as companhias controlem essas substâncias.
Não é por falta de instrumentação para monitoramento que o brasileiro corre esse risco. Há empresas ofertando sistemas práticos e simples para detecção de anormalidades, que podem ser colocados em linha no tratamento de água ou usados de forma portátil para rapidamente afirmar se há problemas no manancial ou na água já tratada. A empresa Ag Solve Monitoramento Ambiental, de Indaiatuba-SP, por exemplo, conta com representações de sistemas de fácil uso para aplicações de monitoramento da qualidade da água para fins de controle ou remediação.

Um da representada inglesa Chelsea Technologies é específico para detectar contaminações por hidrocarbonetos, até mesmo para os dissolvidos em níveis de ppb. “Normalmente há um consenso errado de que os hidrocarbonetos não se dissolvem na água, que eles ficam apenas na fase livre, o que tecnicamente é um absurdo. Eles se dissolvem tanto em sua fase bruta como na refinada e estão muito presentes na água, podendo causar grandes danos ao ser humano”, disse o diretor da AG Solve, Mauro Banderali. Segundo ele, os hidrocarbonetos são responsáveis por 95% das contaminações nas áreas urbanas.
A sonda dedicada para os hidrocarbonetos é a Uvilux, que opera com radiação ultravioleta, cujo feixe de luz banha a amostra dos hidrocarbonetos para detecção pelo sensor em uma determinada frequência. Para Banderali, os sensores digitais são instrumentos de alerta para detecção de acidentes ou vazamentos. Com eles as empresas de saneamento podem tomar as medidas necessárias para interromper bombeamentos, monitorar processos e medir pontualmente ou de forma permanente o tratamento. O sistema também monitora o descarte de efluentes nas indústrias, para saber se a empresa está jogando hidrocarbonetos no ambiente. “Era simples: bastava exigir delas o controle”, disse. Bom ressaltar que a sonda pode detectar desde traços até altas concentrações, como 500 mg/l de HDTs.
Outros sensores que teriam bastante aplicação no Brasil são os das linhas Unilux e Trilux, da mesma Chelsea Technologies, pois têm aplicação para detectar algas e cianobactérias, problema muito frequente em mananciais poluídos por esgoto, caso das represas que abastecem a região metropolitana de São Paulo. Os dois sensores, que podem ser usados de forma portátil ou em linha, monitoram níveis de clorofila-a, ficoeritrina, rodamina WT, ficocioanina, fluorescência ou turbidez na água. São indicados para estudo de clorofila em campo, o que indica a classe de algas (Ficoeritrina ou Ficocianina), monitoramento ambiental, rastreamento da mortandade em lagos, represas e mares por algas, estudo de particulados e controle de processos.
“Os sensores são mais precisos do que os usualmente instalados em sondas multiparamétricas. Apenas eles conseguem no mercado de instrumental detectar, com baixo custo e alto desempenho, as classes de algas, sendo que no Trilux é possível monitorar a clorofila-a em um único elemento sensor”, disse Banderali.
Embora já tenha vendido algumas dessas sondas especiais para monitoramento, o diretor da Ag Solve acredita que a falta de exigência de controle é um impeditivo para o crescimento do mercado. Nesse caso, ele lamenta principalmente a ausência de obrigações impostas a companhias de saneamento e da cadeia do petróleo, para monitorar os hidrocarbonetos. Falando especificamente do controle de algas, o setor de saneamento fixa o monitoramento mais na captação e não na água tratada. O gosto ruim da água distribuída pela Sabesp em algumas regiões de São Paulo tem a ver com a contaminação por cianobactérias, também prejudicial ao ser humano.
Comperj cancela MBR para reúso
Como resultado de sua contenção de gastos, a Petrobras cancelou aquele que seria o maior projeto de reúso de água do país, desenhado para recuperar da ETE Alegria, da Cedae, uma vazão de 1.500 litros por segundo de esgoto para alimentar o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).
O projeto, que estava nas mãos de consórcio entre a Foz do Brasil e a Cedae, chegou a definir a fornecedora da tecnologia de membranas – o MBR (Membrane Bio-Reactor) –, a GE Water, e contemplaria um duto submarino de 17 km de extensão, para levar a água proveniente do esgoto tratado da ETE Alegria, no Caju, até o armazenamento intermediário na ETE São Gonçalo. Também faria parte do sistema uma estação de bombeamento para levar a água tratada por mais 32 km até a entrada do Comperj, em Itaboraí-RJ, onde o insumo seria usado na geração de vapor e em torres de resfriamento.
A grandiosidade da obra – um EPC avaliado em mais de R$ 1 bilhão – foi substituída por uma alternativa mais simples: uma filtração simples permitirá o uso da água utilizada na retrolavagem de filtros da ETA Guandu, da Cedae, por sinal considerada a maior estação de tratamento de água do mundo (43 mil litros por segundo). Embora a ETA seja mais distante do Comperj, os novos cálculos da Petrobras mostraram ser mais viável polir essa água da retrolavagem no complexo do que investir em um MBR na ETE Alegria. Com a desistência da estatal do petróleo, o projeto Aquapolo, em São Paulo, que abastece com água de reúso o polo petroquímico, continua sendo o maior projeto do gênero do país.
Laboratório para etanol 2G
O Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Coppe inauguraram no final de agosto um laboratório de bioetanol. Com investimento total de R$ 14 milhões – R$ 10 milhões da Finep e R$ 4 milhões do governo japonês (Jica, agência de cooperação internacional) –, o propósito principal do centro de pesquisa é se aprofundar na produção do etanol celulósico, o chamado 2G, etanol de segunda geração ou bioetanol.
A ideia é desenvolver tecnologia própria com base na hidrólise enzimática da celulose dos resíduos da agroindústria da cana-de-açúcar e também do milho e do trigo. Segundo a coordenadora do projeto, a professora Elba Bon, o ponto prioritário das pesquisas será permitir a produção das enzimas in loco, nas próprias usinas, para evitar o transporte por longas distâncias.
Também contempla a linha de pesquisa a análise do ciclo de vida do novo processo do bioetanol, para identificar os impactos ambientais de todas as etapas produtivas, incluindo a processamento descentralizado das enzimas.
Conta ainda como contribuição do Coppe os seus desenvolvimentos com membranas de separação, por meio dos trabalhos do laboratório dedicado a essa linha de pesquisa. As membranas elaboradas por seus pesquisadores podem ser empregadas em diferentes etapas de separação e concentração de biomateriais envolvidos no processo. Os sistemas serão fornecidos pela PAM-Membranas Seletivas, empresa incubada que nasceu no laboratório de processos de separação com membranas e polímeros da Coppe.
Como pano de fundo para a elaboração do laboratório está a necessidade de garantir o consumo de etanol no país, visto que a produção convencional da primeira geração não está sendo suficiente para atender à demanda, forçando o país a importar etanol de milho dos Estados Unidos.
“O etanol de primeira geração aproveita apenas um terço da energia contida na planta. Com o 2G é possível no mínimo dobrar a produção sem precisar de mais áreas agrícolas”, afirmou Elba Bon. Além disso, segundo ela, trata-se de tecnologia mais limpa e autossustentável. “Por suas características territoriais e de clima, o Brasil tem capacidade para produzir biomassa em grandes quantidades para fazer frente às necessidades da indústria química do futuro”, finalizou Elba.