Cuidados ambientais e com a saúde ocupacional têm levado o mercado de solventes industriais a uma contínua evolução.
Nos mercados de tintas e tintas para impressão, responsáveis por praticamente 40% do consumo total deste insumo, os solventes hidrocarbonetos estão perdendo espaço para os oxigenados, considerados menos agressivos.
Mas a evolução também passa por melhorias dentro do próprio segmento dos oxigenados, que tem privilegiado o lançamento de produtos que primam por reduzir ainda mais os impactos ambientais e à saúde.
Também começa a ganhar corpo o conceito de solvente verde, aquele que alia às características amigáveis ao meio ambiente a vantagem de ser obtido de fontes renováveis.
A busca de soluções ambientalmente amigáveis já ocupa o espaço central nos laboratórios de pesquisa e desenvolvimento dos produtores de solventes industriais.
Em países de desenvolvimento avançado, como Estados Unidos, Japão e os da Comunidade Europeia, a força de legislações que regulamentam a toxicidade dos solventes e as emissões aceitáveis de compostos orgânicos voláteis (VOCs) em produtos como tintas e vernizes gera o impulso necessário a uma rápida migração em direção aos chamados solventes amigáveis.
Em países menos desenvolvidos, como o Brasil, não há o estímulo legal para a migração, mesmo assim os solventes oxigenados ganham espaço, por exigência do mercado comprador, principalmente dos fabricantes multinacionais de tintas, tintas para impressão e adesivos.
Alexandre Castanho avalia o mercado mundial em 20 milhões de toneladas/ano
Alexandre Castanho, diretor da Rhodia Solventes América Latina, avalia o mercado mundial de solventes industriais “em 20 milhões de toneladas/ano.”
Segundo os dados da companhia, a participação dos oxigenados passou de 58%, em 1997, para 70%, em 2007, e a estimativa da empresa é de que essa participação alcance 80% em 2017.
Por sua vez, os hidrocarbonetos, que detinham uma participação de 25% em 2007, devem recuar para 18%, enquanto os solventes clorados, hoje praticamente banidos na indústria de tintas, devem ter sua participação reduzida de 5% para 2%.
Na América Latina, onde o consumo de solventes soma pouco mais de quatro milhões de toneladas anuais, sendo o Brasil responsável por 80% deste consumo, a participação dos oxigenados ronda a casa dos 50%.
Jorge Duval, executivo de marketing para solventes e intermediários e éter glicólico da Dow para América Latina, também calcula que a taxa de crescimento dos oxigenadas supere à dos hidrocarbonetos. Ao analisar o mercado de tintas, o principal consumidor de solventes oxigenados, ele detecta dois perfis de demandas característicos.
O perfil das regiões emergentes e o perfil das regiões mais desenvolvidas tecnologicamente, no qual estão Estados Unidos e Europa.
Jorge Duval: emergentes consomem mais tintas com base solvente
“A diferença entre os dois perfis é que nas regiões emergentes o consumo de tintas e vernizes base solvente é ainda bem maior do que o das tecnologias como altos sólidos e base água, eletrodeposição, em pó e curadas por radiação”, disse o executivo.
O avanço das tecnologias de tintas sem solventes faz o consumo do insumo no segmento de revestimento diminuir 1% ao ano, enquanto as demais matérias-primas para pinturas crescem 2,6% ao ano.
Segundo o executivo, dentro do segmento de solventes, com diminuição anual de 1%, os solventes hidrocarbonetos caem mais de 3% ao ano, enquanto os oxigenados crescem quase 1% ao ano.
“A tecnologia base solvente continuará dominando o mercado por muito tempo e os oxigenados, que fornecem as necessidades de desempenho procuradas pelos formuladores, atendendo às mais rígidas regulamentações ambientais, ganharão mercado sobre os outros solventes”, afirmou Duval.
No mundo, os oxigenados começaram a se destacar a partir dos anos 90, com o Clean Air Act, da Environmental Protection Agency (EPA) dos EUA, que estipulou um processo gradual de redução do uso de solventes que atacam a camada de ozônio, a exemplo dos clorados e hidrocarbonetos.
Na mesma época, estudos demonstraram o impacto negativo à saúde do trabalhador gerado pela manipulação de benzeno, tolueno e xileno, itens que, em muitos casos, compõem a rota de produção dos solventes hidrocarbonetos.
Os solventes oxigenados também são compostos por carbono e hidrogênio, mas incorporam em suas moléculas átomos de oxigênio que facilitam a dispersão e geram menor impacto à camada de ozônio e à saúde humana.
As principais famílias de solventes oxigenados são compostas por álcoois, cetonas, ésteres, glicóis, acetatos e éter glicólicos. Mas os oxigenados não são adequados para todas as aplicações. Seus principais usos estão em sistemas de tinta com altos sólidos, epóxis e poliuretanos.
Não são recomendados, por exemplo, para esmaltes sintéticos.
Como analisa o consultor Luis Manuel Mota, da LM Coating Advancing, no Brasil o que impede a migração mais rápida para os solventes oxigenados ainda é o custo do insumo.
Enquanto os solventes hidrocarbonetos são obtidos pelo simples refino do petróleo ou como subproduto petroquímico, os oxigenados são elaborados por sínteses industriais, mediante um custo produtivo mais alto.
Luis Manuel Mota: custo dos oxigenados inibe um pouco o seu uso no Brasil
“Em relação aos hidrocarbonetos, os oxigenados ésteres custam de 10% a 50% a mais; as cetonas, de 20% a 40%; e os glicóis são de 40% a 100% mais caros”, informou o consultor.
Por outro lado, os oxigenados apresentam uma produtividade maior. Para Mota, apenas quando o Brasil adotar uma regulamentação restritiva em relação aos VOCs é que ocorrerá uma migração definitiva em direção aos oxigenados.
A Associação Brasileira dos Fabricantes de Tintas (Abrafati) discute essa regulamentação há dois anos e Mota, que já fez parte da comissão de análise do problema na associação, acredita que a primeira autorregulamentação do mercado deverá ser divulgada nos próximos meses, por enquanto restrita ao segmento de tintas imobiliárias.
Basicamente, informa Mota, o que tem atrasado a decisão da Abrafati é uma divergência sobre a definição de VOC. Há o modelo europeu, que leva em consideração a composição da tinta, e o norte-americano, com foco na quantidade de material que evapora e seu impacto ao meio ambiente.
A tendência brasileira, acredita Mota, é seguir a definição europeia.
Outra questão que pode inibir um avanço mais rápido dos solventes oxigenados é a conjuntura econômica restritiva de 2009. Alexandre Castanho, da Rhodia, avalia que a crise mundial deve gerar uma queda no consumo global de solventes de 20%.
No Brasil, de 9%. Carlos Tooge, gerente de vendas da divisão química da Lyondell Basell, trabalha com números parecidos em relação ao mercado brasileiro.
Já Andréa Soares, gerente de marketing de outro importante produtor de solventes, a Oxiteno, tem uma visão mais otimista da conjuntura e acredita que as vendas do insumo no país em 2009 deverão ficar no mesmo patamar registrado em 2008.
Andréa Soares: novo solvente para substituir os de base tolueno
“Mas será um ano de baixa rentabilidade, pois as empresas terão que encurtar margens para manter clientes”, disse a executiva.
Independentemente do resultado final, crescimento zero ou negativo, nenhuma das duas situações é propícia ao avanço de inovações que gerem aumento de custo.
Portanto, no mercado de solventes não são muitas as apostas de grandes conquistas dos oxigenados sobre os hidrocarbonetos.
Uma exceção é Carlos Tooge, para quem a crise econômica tem permitido às empresas usuárias de solventes a utilização de seus laboratórios, que estão sendo menos demandados no momento, para realizar o desenvolvimento de novos produtos, preparando-se para o pós-crise.
E a tendência, aposta Tooge, é de que esses desenvolvimentos privilegiem tecnologias mais avançadas, como é o caso dos desenvolvidos com solventes oxigenados.
Investimentos – Conjuntura negativa e falta de regulamentação não impedem, porém, que os produtores de solventes oxigenados busquem inovações tecnológicas e tracem estratégias para ampliar seus mercados. A Oxiteno, por exemplo, está concluindo um investimento de R$ 51 milhões em uma nova unidade de acetatos em Mauá-SP.
A nova linha mais que duplicará a capacidade produtiva da empresa, com um volume adicional de 40 mil toneladas por ano de solventes, com 35% da produção a ser destinada ao mercado externo.
A partida da nova capacidade estava prevista inicialmente para junho, mas só deverá acontecer em setembro.
Andréa Soares informa que essa instalação permitirá à empresa ampliar significativamente a oferta de um novo produto, que já vem sendo apresentado de forma limitada ao mercado: o solvente acetato Ultrasolve M-1200.
Ela informa que o Ultrasolve M-1200 possui características que permitem, por exemplo, substituir os solventes hidrocarbonetos obtidos pela rota do tolueno.
O produto é compatível com a maioria das resinas acrílicas, celulósicas, epóxis, poliéster, poliuretânicas e sistemas híbridos, com uso possível em formulações de tintas base solvente, como as linhas automotivas, para madeira, industriais e nos tíneres.
A vantagem do produto, segundo Andréa, são suas características amigáveis ao meio ambiente.
“É um solvente médio, de acetato de sec-butila, possui alto TLV (limite de tolerância de exposição ao trabalhador), baixo VOC e não consta na lista HPA (Hazardous Air Pollutants – poluentes perigosos no ar)”, informou.
“A receptividade ao solvente tem sido excelente no mercado e a nossa expectativa, em um ano, é de superar a casa das 10 mil toneladas comercializadas”, salientou.
Solventes verdes – Na Rhodia, a grande aposta é o lançamento de um novo solvente, marcado para setembro, durante o congresso e feira Abrafati 2009.
Alexandre Castanho faz segredo sobre o novo produto, revelando somente tratar-se de um solvente verde, amigável à saúde humana e ao meio ambiente, obtido de biomassa, matéria-prima renovável. Mais não informou.
“Nossa expectativa para essa novidade é muito positiva, uma vez que ele irá complementar as linhas de solventes industriais da Rhodia no mercado de tintas e vernizes, abrindo a possibilidade de atuarmos em segmentos hoje dominados por linhas de solventes mais agressivas”, limita-se a dizer o executivo.
A Rhodia tem em Paulínia-SP sua planta mundial de solventes industriais, da qual a metade da produção é destinada ao mercado externo.
A fábrica produz solventes oxigenados obtidos de duas rotas químicas, do etanol e do fenol, com participações praticamente idênticas de mercado.
Castanho lembrou que os solventes de etanol já são considerados verdes, uma vez que são obtidos de uma matéria-prima renovável.
“Nessa linha de produtos, nossas vantagens competitivas, com planta instalada no Brasil, grande produtor de álcool, são significativas”, disse o executivo.
Outra inovação verde que pode chegar ao mercado são os solventes derivados de óleos vegetais, conforme informou Luis Mota.
“São solventes que têm, em geral, faixa de destilação bem alta e poderão substituir solventes em algumas tecnologias, por exemplo, no látex”, disse o consultor.
O óleo de soja vem sendo bastante estudado com este objetivo, especialmente na Alemanha.
Carlos Tooge, da Lyondell Basell, avalia que a química verde é uma estratégia em análise por vários produtores de solventes.
A própria Lyondell tem estudos avançados na área, mas ainda são poucas as empresas com decisões de investimentos.
Certos são os avanços no desenvolvimento de solventes oxigenados menos agressivos, independentemente de sua rota de produção.
Na Lyondell, dois novos solventes oxigenados com essa característica chegaram recentemente ao mercado.
Primeiro um acetato de terc-butila, isento de VOC e de HPA.
Carlos Tooge: crise permite uso de laboratórios para pesquisa
Como informou Tooge, “é um solvente que vem sendo utilizado em blendas com toluenos, reduzindo emissões nocivas.”
No Brasil, a Akzo já emprega o solvente na produção de tintas automotivas e o produto está em fase de testes e desenvolvimento, informou Tooge, em outras oito empresas, com boas posições em seus respectivos segmentos de mercado.
O outro produto é um carbonato de propileno também isento de VOC e de HPA, porém ainda em fase de avaliação nos Estados Unidos.
No mercado brasileiro de solventes para tintas, a Lyondell atua no segmento de especialidades, com solventes importados da América do Norte e desenvolvidos com éteres de propilenoglicol, éteres de etileno glicol e acetatos, produtos que reduzem a taxa de evaporação e ajudam o filme a se firmar de forma mais uniforme.
Outra empresa que atua no Brasil tendo como estratégia a importação é a Dow, trazendo produtos dos Estados Unidos e da Argentina.
Segundo Jorge Duval, as vantagens estratégicas da empresa nesse mercado são a escala, uma vez que se trata, como afirmou, do maior produtor mundial, e a amplitude de seu portfólio de solventes.
“Produzimos todos os tipos de solventes, o que nos permite oferecer flexibilidade de formulação aos nossos clientes”, afirmou o executivo.
Perguntado sobre novos produtos e tendências de evoluções tecnológicas, Duval se limitou a dizer que “muitas companhias têm foco em tecnologia de formulação de solventes e a Dow conhece o tema.
Mas a evolução real dos solventes oxigenados está por trás da sofisticação do consumo.
A Dow está trabalhando no desenvolvimento de novas tecnologias e processos para acompanhar essa demanda por novos solventes”.