Químicos: Sinal da química verde se abrirá em 2011
Sinal da química verde se abrirá em 2011, o Ano Internacional da Química

A nova diretoria da Sociedade Brasileira de Química (SBQ) estabeleceu ações educativas de comunicação, políticas e administrativas como metas mais significativas de sua gestão.
Depois de assumir a presidência da SBQ durante o seu 33º encontro anual – que reuniu mais de três mil profissionais de 28 a 31 de maio, em Águas de Lindoia-SP –, o professor César Zucco explicou que as propostas foram norteadas pelo lema “Química Por Um Mundo Melhor”, proclamado na assembleia geral da Organização das Nações Unidas (ONU), que estabeleceu 2011 como o Ano Internacional da Química.
A partir do próximo ano, a Unesco se encarregará de movimentar a comunidade química mundial com ações regionais lideradas pelas suas sociedades nacionais de química, enquanto localmente a SBQ vai desenvolver uma discussão nacional em torno do tema.
Além dessas diretrizes, o professor Zucco adiantou que os químicos têm que ocupar mais e melhor os espaços propositores de políticas de desenvolvimento.
“Entre os membros da Comissão Nacional de Ciência e Tecnologia e Inovação participam pouquíssimos químicos, proporcionalmente. Em relação a outras áreas somos minoria”, disse o novo presidente da ABQ, professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e diretor-científico da Fundação de Amparo à Pesquisa desse estado (Fapesc).
Isso, apesar de o setor químico figurar como o terceiro que mais contribui para o PIB brasileiro, após os segmentos de alimentos, bebidas e combustíveis – que evidentemente têm sinergia direta com o setor. O parque químico na cadeia produtiva do setor petrolífero foi responsável pela movimentação de R$ 122 bilhões em 2008, equivalente a aproximadamente três por cento do PIB. Na somatória global, o setor químico é responsável por aproximadamente 30 por cento do PIB.

A ex-presidente da ABQ, professora Vanderlan Bolzani, garantiu a continuidade de sua participação no trabalho dentro dos objetivos da atual gestão da entidade, como integrante do conselho consultivo. “Estamos deixando uma sólida base de avanço para a próxima diretoria”, disse a professora Vanderlan, declarando-se gratificada ao ver as salas de simpósios, cursos e corredores repletos de jovens profissionais químicos. Numa conversa aberta e sem formalidades com esses jovens ao iniciar os trabalhos da ABQ, o Prêmio Nobel de Química Martin Chalfie, pesquisador do Departamento de Ciências Biológicas da Universidade de Columbia (EUA), observou que atualmente deve-se buscar formas de instigar a juventude para o mundo da ciência, valorizando a pesquisa básica, lançando um alerta para a necessidade de uma postura devotada que segundo ele requer a disposição “de estudo permanente ao longo de toda a vida”.
O ano sem fim – Para o professor Zucco, as iniciativas da ABQ nos próximos meses visam a estimular o conhecimento, as funções e a presença da Química nos diversos estratos da sociedade “para que toda a sociedade se una em uma reflexão conjunta sobre o papel da Química para manter o avanço civilizatório de um mundo justo e sustentável”. Segundo ele, 2025 foi escolhido como ano base para as primeiras avaliações dessa projeção sob o ponto de vista de desenvolvimento científico e tecnológico e também da formação do químico.

Os enfoques de discussão foram concebidos como autênticos marcos fixos para o percurso do novo caminho de sustentabilidade para o setor. “Nós depreendemos que o Ano Internacional da Química já começou e deverá continuar ad aeternum, para realmente aplicar com firmeza e rigor o conjunto de medidas de preservação e sustentabilidade ambiental necessárias para a conservação do planeta”, afirmou.
Durante o século 20, a imagem da Química foi manchada por experiências ligadas com a aplicação inconsequente de conhecimentos assimilados em seu âmbito de atuação, independentemente dos benefícios científicos e tecnológicos proporcionados. “Os profissionais da Química sabem o que seria da humanidade sem os desenvolvimentos da ciência, mas a sociedade não tem clareza do que significa a Química para o desenvolvimento ou, indo além, a importância da Química no cotidiano de sua vida”, destacou Zucco.
Quando se diz que a Química tem a pecha de ser poluidora, letal e perigosa, não há como negar a existência da fabricação de vários produtos e processos que impactam o ambiente ou oferecem outros riscos. “Mas o controle disso depende de ações da sociedade. Se temos o processo sujo de uma determinada indústria, compete à sociedade bloqueá-lo e exigir a sua substituição por processos limpos”, disse Zucco. Para ele, é nesse ponto que a química verde, limpa e sustentável, resume toda a questão, rompendo com antigos paradigmas. “Em todo o mundo desenvolvido e aqui também, a sociedade se articula e já está aprendendo a se mobilizar para o boicote do consumo de produtos ambientalmente incorretos”, salientou.
A indústria tem uma clareza muito grande em relação a esse movimento dos consumidores e, segundo o professor Zucco, há décadas se preocupa em evitar ou reduzir ao mínimo os efeitos dos seus produtos. “Nós temos duas linhas de ação em relação a isso: primeiro, temos que desmistificar essa pecha da química como uma indústria prejudicial. É uma questão de convencimento, mostrar a utilidade que ela tem”, esclareceu o professor Zucco.
Prioritariamente, as crianças e jovens são o público-alvo para essa campanha de esclarecimento com apoio da American Chemical Society, basicamente composta por uma série de programas, com material didático, exposições e pôsteres temáticos. “É necessário mostrar a beleza da Química na vida, nos materiais sintéticos, tratamento de superfícies, roupas, informática, alimentação, porque tudo na verdade é baseado na química pura”, explicou o novo presidente da SBQ.
A Química é central e transversal, porque também permeia vários outros processos biotecnológicos, físicos, matemáticos, nanotecnológicos. “Temos que mostrar que a Química é central não apenas para o desenvolvimento e a vida humana, mas em relação às outras disciplinas.” As ações de conscientização da sociedade deverão ser acompanhadas de outras que dizem respeito ao trabalho do químico, propriamente. Segundo explicou, as ações envolverão todos os públicos que atuam diretamente na química: na escola secundária, na universidade (coordenadores dos cursos de graduação e pós-graduação) e nos conselhos regionais, que já estão recebendo material para começar a trabalhar.
Zucco avaliou que a consciência profissional e cidadã dos químicos que atuam nos diversos segmentos de produção ainda “não é tão afiada e avançada como a dos empresários, até porque a percepção das exigências de sustentabilidade que começaram a balizar a aceitação dos produtos pelo mercado são motivo de constante preocupação de sobrevivência dos negócios”, avaliou.
Para Zucco, a mão de obra para a indústria precisa ser melhor preparada para atuar dentro dos parâmetros de sustentabilidade. Mesmo com boa formação acadêmica, falta aos químicos uma complementação sobre as noções de cuidados com o meio ambiente, com a periculosidade, com a inovação, com as leis e normas. “A preocupação da formação e informação do cidadão é global, em todos os estratos sociais, mas, na outra ponta, também temos que nos preocupar com a excelência da formação dos recursos humanos”, recomendou.
A ideia é formar bons profissionais químicos, que além de toda uma formação clássica, inclua alguns elementos mais heterogêneos em sustentabilidade. Isso não apenas no segmento químico, mas em todo o processo econômico, deve ser multidisciplinar, incluindo os aspectos como gestões legais da sustentabilidade – base que deveria ser oferecida pela universidade.
A química verde, segundo o professor Zucco, é nada mais nada menos do que uma postura de consciência que reflete o aprimoramento da formação do químico para atender às exigências de mercado de trabalho. A empresa química tem vida própria e sabe o que quer. Quando não dispõe dos recursos humanos necessários, aceita os que estão disponíveis e dá um jeito de prepará-los dentro de uma visão adequada a ela, às vezes até mais avançada do que a adotada pela academia, por conta dos diversos valores que a empresa agrega às suas áreas de pesquisa, desenvolvimento e produção.
Os aspectos do intercâmbio e a transferência de conhecimento entre a universidade e as empresas químicas indicam outra chave para gerar um relacionamento mais produtivo, inovador e arrojado. “Com diferentes facetas, esse é um assunto recorrente e ainda será necessário desfazer os gargalos nessa relação universidade-empresa”, admitiu.
Ambiente sob pesquisas – Os cursos, palestras, workshops e apresentação de trabalhos de desenvolvimento na polivalente atividade química em praticamente todas as suas derivações, tecnológicas, ambientais, farmacológicas, e os resultados das pesquisas de novas fontes de energia na 33ª Reunião Anual da SBQ acabaram desvelando os novos panoramas da pesquisa universitária nacional para dois fatos estimulantes: o aumento significativo de produtividade e a maior aproximação no relacionamento entre a universidade e a indústria.
A programação da sessão coordenada no segmento Química Tecnológica possibilitou a apresentação de projetos e ideias inovadoras de empreendedores, ligados à universidade ou não. “Esta é a segunda vez que a sessão acontece na grade da Reunião Anual, tendo como objetivo a pesquisa aplicada e a perspectiva de manter um canal de exposição para a sociedade”, informou Carlos Martins, assessor de imprensa da ABQ.
Nessa última edição do encontro científico da ABQ, foram apresentados trabalhos de profissionais de universidades que mantêm um intercâmbio de transferência de conhecimentos com a indústria, a exemplo dos painéis Bioetanol: Perspectivas de Produção a partir da Biomassa, apresentado pelo professor Renato Wendhausen Junior (Furb), e A Química do Futuro no Presente – Aliando o Desenvolvimento de Produtos Sustentáveis à Realidade Industrial, proferida por Paulo Roberto Garbelotto, gerente de pesquisa e desenvolvimento da Rhodia.
No simpósio A Visão da Química no Brasil em 2025, o engenheiro da Petrobras Eduardo Falabella Souza Aguiar historiou sua pesquisa e desenvolvimento do Dimetil-Éter: o Combustível do Século 21, enquanto o diretor técnico da Associação Brasileira de Química (Abiquim), Marcelo Kós Silveira, informou sobre as implicações e o andamento das reuniões para o pacto nacional da indústria química.
A professora do Instituto de Química da Unicamp Cláudia Longo, embora ainda esteja realizando os estudos para aumento de escala em sua pesquisa, falou sobre a criação de um sistema abastecido por energia solar capaz de remover poluentes orgânicos. Em uma etapa posterior, o tratamento de água à base de eletrodos de dióxido de titânio e contra-eletrodo de cobre, conectados a células solares que a professora Cláudia está desenvolvendo, possibilita a recuperação de metais de soluções aquosas.
Três sinais de risco – Em um levantamento sobre as ameaças à manutenção da vida, os especialistas coligaram três níveis que já dão sinal vermelho, exigindo acepções que ultrapassam soluções técnicas, como ponderou o professor Arnaldo Alves Cardoso, do Instituto de Química da Unesp de Araraquara, na conferência Química Ambiental: Entre o Futuro Desejável e o Possível. Para ele, esses três níveis estão relacionados com as mudanças climáticas globais, em acidentes ambientais e na perda irreversível da biodiversidade. Um quarto gargalo desse problema, segundo o professor, seria a disseminação dos fertilizantes: “Uma solução criativa que permitiu ao ser humano vencer a fome, mas aumentou a presença do nitrogênio em solos, águas e na atmosfera”, criticou Cardoso. O excesso desse elemento provoca o crescimento incontrolável de algas em rios e lagos, expelindo toxinas que colocam em risco os pescados e a água potável.
Cardoso avaliou que as respostas técnicas para a correção desse quadro são incipientes diante do estilo de vida considerado ideal pelas populações dos países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Segundo ele, existe uma contradição quando se considera que “todos desejam ter automóveis potentes, consumir bens descartáveis, manter um padrão de vida de alto consumo de energia e, ao mesmo tempo, assegurar esse padrão para as próximas gerações”.
Alimento, água potável e energia são insumos básicos que estão com a produção perto do esgotamento nas próximas décadas. O impasse nas alternativas técnico-científicas para a preservação da vida se dá nos aspectos políticos e nos de pura e simples consciência das sociedades em relação às suas escolhas e decisões.
No salão Royal do Hotel Monte Real Resort, no espaço entre o balcão de credenciamento da 33ª Reunião da SBQ e o movimento nos estandes das 29 empresas que demonstravam seus lançamentos em instrumentação e processos laboratoriais, enquanto autografava o seu livro “Mister Uni e o Incrível Mundo Microscópico”, a jovem doutora em química Grace Kelli Pereira somava sua iniciativa independente às propostas de ações de comunicação inspiradas no tema “A Química construindo um futuro melhor”, que pretende elevar a consciência das novas gerações em relação à disciplina.
“É um livro lúdico para as crianças colorirem, com texto e figuras que remetem aos conceitos de partículas atômicas na formação dos elementos da tabela periódica. Enfim, um enredo ilustrando os fundamentos da Química”, explicou Grace Kelli, que publicou o livro em coautoria com a irmã e ilustradora Nila Mara Pereira. As duas pretendem avançar na temática com outros projetos para demonstrar a presença da Química no cotidiano: na escola, na cozinha, nas roupas, nos alimentos.
A SBQ já dispõe de um site voltado com esse objetivo de formação e informação dedicado às crianças (http://quid.sbq.org.br). Responsável pelas tarefas de criar e suster meios alternativos de abrangência nacional dentro dessa proposta de informação, a professora Cláudia Rezenda, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, disse que a ideia é utilizar a cultura e a linguagem regionais para passar as mensagens. “No Recife, por exemplo, já estamos preparando a apresentação de bonecos de mamulengo para transmitir os conceitos da química verde”, explicou Cláudia. “Iremos aplicar esse recurso em relação a todas as camadas da população dentro de suas distintas formas de expressão, principalmente pelos meios eletrônicos.”
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