Queimadores: Equipamentos a gás reaquecem o setor
A disponibilidade do gás natural e o uso do GLP como combustível industrial impulsionam a venda de queimadores

Finalmente em curso, o uso do gás como combustível industrial começa a criar um clima de contentamento junto aos fabricantes de queimadores. Depois de muitos anos de expectativa, a substituição de equipamentos projetados para queimar o ultrapassado óleo pesado pelos específicos para o gás deslanchou a partir de 2001. É consenso entre as principais empresas que, a despeito do desempenho tímido da economia, as vendas se revelaram bastante satisfatórias. e as perspectivas para os próximos 5 a 10 anos, prazo estimado para a troca quase total dos queimadores antigos, devem ser de continuidade da bonança.
A oferta de gás natural, aumentada de forma considerável com a entrada em operação do Gasoduto Brasil-Bolívia, não foi a única responsável pelo bom desempenho do mercado. Muitos clientes, principalmente os ainda não cobertos pelos ramais do gás boliviano, adotam com freqüência o gás liqüefeito de petróleo (GLP), fornecido pelas distribuidoras em grandes cilindros estacionários.

A tendência do GLP tem duas motivações. Em primeiro lugar, as empresas optam por esse combustível como uma etapa preliminar para a futura disponibilidade de gás natural em suas regiões. Já a segunda motivação reside no fato de os órgãos ambientais estarem recomendando a adoção dessa matriz energética limpa como forma de as fiscalizadas adequarem seus padrões de emissão de poluentes.
Houve ainda um outro aspecto positivo para o setor de queimadores. A crise energética no segundo semestre apressou alguns investimentos em sistemas de calor mais modernos e econômicos. Nesse caso houve a opção não só por queimadores a gás para substituir o óleo como para tomar o lugar de sistemas de estufas elétricas, por exemplo. Com todo esse cenário favorável, hoje o uso do óleo combustível, na opinião dos fabricantes de queimadores, limita-se mais a empresas de menor porte localizadas em regiões interioranas do País.
Recorde de vendas – Uma idéia do novo gás do segmento se consegue pela análise do desempenho de uma companhia tradicional, a Weishaupt, grupo alemão que comemorou 30 anos de Brasil em 2001.
Para o diretor da filial local, Johann Braun, o ano do aniversário foi também o melhor da história da empresa, tanto em faturamento como em lucros.
Apesar de recentemente a Weishaupt ter reduzido várias de suas despesas – como na ocupação de um prédio menor e o aluguel do restante de sua área construída de 8 mil m² no bairro de Santo Amaro, em São Paulo –, o motivo principal para os bons resultados foi a nova demanda por queimadores a gás.

Mesmo sem revelar o volume ou o valor das vendas de queimadores, Braun afirma, em termos percentuais e em moeda nacional, que as negociações subiram 42,4% em comparação com 2000 e, em faturamento, 46,6%. As vendas totais e o faturamento, incluindo-se aí serviços e reposição, elevaram-se por volta de 28%.
Para Braun, esse desempenho em vendas de equipamentos deve se manter nos próximos anos e, no caso de serviços e reposição, há a certeza de aumento, tendo em vista o maior número de queimadores da empresa em operação no mercado.
Outros percentuais apresentados pelo gerente comercial da Weishaupt, Carlos Rico, confirmam a influência da opção pelo gás nas vendas da empresa. Dos queimadores comercializados em 2001, 79,6% operavam com gás; 10,8% eram sistemas duais (óleo e gás); 1,3% foram reformas de equipamentos de óleo para gás; e apenas 8,3% ainda usavam o óleo pesado como combustível de queima. “Esses números ganham mais importância ao se lembrar que há quatro anos o perfil era completamente contrário, ou seja, 80% das vendas eram de queimadores de óleo”, comparou Rico. De 2000 para 2001 a mudança também foi marcante, já que no primeiro ano as vendas revelaram igualdade entre os dois tipos.
Para entender melhor os negócios surgidos com o gás, vale citar mais algumas porcentagens apontadas pela Weishaupt. Dos 79,6% de queimadores monoblocos e duoblocos para gás vendidos pela empresa, cerca de 50,1% foram em fornecimentos para GLP; 29,3%, para o natural; e 0,2% de gás de nafta. Para o diretor Johann Braun, além de explicar a ainda não disponibilidade integral do gás natural, esses números revelam a facilidade de conversão desses sistemas.
“Quando o gás natural chega, e a empresa já está com o GLP, basta fazer um ajuste na vazão do queimador”, diz. O ajuste, realizado por um técnico da empresa, é necessário porque o poder calorífico do gás natural é menor, o que demanda uma entrada maior de gás no equipamento para se ter a mesma capacidade de queima.
As vendas para atender os sistemas de GLP criaram até um novo tipo de cliente: as companhias de distribuição de gás, como Ultragás, Minasgás, Shell, entre outras. Isso porque, para incentivar o uso do GLP em indústrias, as próprias distribuidoras financiam as reformas dos sistemas de aquecimento, adquirindo no mercado queimadores, caldeiras, entre outros equipamentos, e cobrando o investimento por meio de acréscimos no valor da tarifa de consumo do gás.
Para distribuidoras – Alguns fornecedores estão tirando bastante proveito do mercado das distribuidoras, sobretudo aqueles que conseguem ofertar queimadores com custo reduzido. Seria o caso de fabricantes italianos, como Ecoflam e Riello, ou de nacionais, como a RayBurners. Já a Weishaupt, segundo explicou seu gerente comercial, Carlos Rico, não enxerga nesse mercado um filão para a empresa. “Vendemos direto para os clientes, pois as distribuidoras visam apenas o preço e não é esse o nosso perfil”, critica.

Já a Ecoflam, desde 2000 com subsidiária brasileira (antes possuía uma representante, a Petra), acusa boas vendas para os distribuidores de gás, sobretudo em equipamentos de pequeno porte. De acordo com o seu diretor, Alberto Vieira Fernandes Jr., sua linha de queimadores monoblocos de 30 mil kcal/h até 6 milhões de kcal/h e de duoblocos de 300 mil a 25 milhões de kcal/h estão sendo absorvidos de maneira crescente, na maioria dos casos, para operação em sistema dual. “Muitos temem uma possível indisponibilidade de fornecimento de gás e procuram se garantir com a opção de operar com óleo numa eventualidade”, diz Fernandes.
A própria decisão da Ecoflam de passar a atuar no Brasil diretamente com uma filial está totalmente ligada à ascensão do gás. Com estoque mínimo de 500 queimadores na sede em São Paulo, a empresa tem concentrado sua atuação no mercado industrial, embora também forneça equipamentos menores para panificação, hotéis e móteis. Fernandes reconhece a tendência de uso preliminar do GLP para posterior adesão ao gás natural. “Nossos queimadores para os dois gases são os mesmos”, diz.
Além das linhas já citadas, a Ecoflam ainda dispõe dos chamados queimadores de alta velocidade, indicados para operações de altíssima temperatura (até 1.880ºC) em fornos industriais e químicos. No momento, aliás, lança uma nova linha, a EMB, para gás. Todos os equipamentos da Ecoflam, segundo Fernandes, possuem controle automático com sensores para detecção de temperatura, descarga e sistema de autobloqueio.
Essa última característica é para o caso de haver algum problema de operação. Isso ocorrendo, o queimador pára de funcionar e apenas um técnico da Ecoflam conseguirá recolocá-lo em operação.
As perspectivas indicadas para a empresa italiana depois da abertura da filial continuam a animar a matriz e seu sócio no Brasil, o diretor Alberto Fernandes. Conforme ele, acaba de ser adquirido um terreno na via Anhanguera, em São Paulo, onde será construída a nova sede da empresa. Está nos planos também a nacionalização de boa parte dos queimadores, sobretudo na fabricação de componentes estruturais.

Nacionalização – Em razão de quase todos os queimadores utilizados no Brasil serem importados total ou parcialmente, as empresas não ficaram muito preocupadas em nacionalizar a produção para compensar a desvalorização cambial. Mas também não se esqueceram de todo dessa estratégia comercial, sobretudo com o mercado mais competitivo. Estima-se que além dos cerca de cinco importantes fornecedores (Weishaupt, Riello, Rayburners, Ecoflam e Kei-Tek), existam mais uns 15 menores. Mercado com faturamento aproximado de R$ 60 milhões, deve ainda atrair mais interessados. Isso não só em razão do gás, mas também da idade avançada dos sistemas de calor industrial no País, já beirando em média os 30 anos e com necessidade urgente de renovação.
Foi para se tornar mais competitiva que a Rayburners, fundada há cinco anos por um ex-diretor da Weishaupt, iniciou um processo de nacionalização de seus queimadores duoblocos, baseada em tecnologia da alemã Ray. A produção local, porém, limita-se ao corpo e à parte interna dos queimadores, ou seja, os componentes estruturais do equipamento. Isso porque as válvulas e comandos de gás são produzidos apenas por empresas alemãs, como Landis&Gyr, Dungs e Medenus, e obrigatoriamente são importados por todos os que se arriscam a produzir queimadores no mundo.
“Com a nacionalização, conseguimos reduzir em até 45% o preço de nossos equipamentos”, afirmou o gerente de vendas da Rayburners, Carlos Geissler. Em virtude do sucesso da empreitada, a intenção é fazer em breve o mesmo com a linha de monoblocos.
A estratégia de nacionalizar ao máximo a produção visa conquistar, entre outros clientes, as distribuidoras de GLP. “As companhias compram os queimadores para indústrias pequenas, com necessidades de até 50 t de vapor, e procuram equipamentos de baixo custo”, afirma Geissler.
Além das companhias de distribuição de GLP, a Rayburners também fechou negócios direto com os especializados em gás natural. Recentemente, para a Companhia de Distribuição de Gás do Rio de Janeiro (CEG), a empresa venceu concorrência para fornecimento de 18 queimadores especiais, de origem alemã, que serão usados em três caldeiras da Petroflex para 100 t de vapor cada, em Duque de Caxias-RJ. Trata-se, segundo o gerente Geissler, do maior contrato do País em se tratando de gás natural. a obra visa substituir antigo uso de óleo 2A como combustível.

Embora tenha o mesmo nome do grupo alemão Ray International, a Rayburners é de capital nacional. Sua linha contempla os queimadores especiais copo-rotativo da própria Ray, voltados para óleo até a classificação 4A e para gás natural. Na área de monoblocos e duoblocos e também de spray-driers para secadores, a empresa representa a italiana Baltur. Outra empresa de mesma nacionalidade, a NPB, completa o portfólio da Rayburners com queimadores de alta velocidade para fornos siderúrgicos, com capacidade para operação de até 1.500ºC.
Outro sistema, de fabricação própria, é o queimador cortina de ar tipo RCA, para operação dentro de fluxos de ar, para processos onde não se permite chama direta, como nas indústrias têxtil, alimentícia e química. Esse modelo dispensa o uso de gerador de ar quente e volta-se para temperaturas de até 450ºC.

Com as vendas de todos esses modelos, a Rayburners comemorou 2001 como o melhor ano de sua breve história. Seu crescimento alcançou 60%, significando faturamento de R$ 5 milhões. O mercado de gás representou 70% das vendas, sendo boa parte dos queimadores fornecidos em sistemas duais óleo-gás. “Boa parte das empresas teme a possibilidade de desabastecimento de gás natural, fato por sinal muito difícil de ocorrer”, explicou Carlos Geissler.
Segundo o gerente, a migração para o gás começou no GLP e começou a se intensificar para o natural a partir de 2001. Muitos clientes, como Nestlé e Danone, reajustaram seus queimadores, a princípio concebidos para o GLP nesse período. A rapidez dessas empresas em trocar de combustível foi muito maior do que o tempo levado para os ramais do Gasoduto chegarem às suas portas. Principalmente para fugirem do último aumento do GLP: de 22% em janeiro.
Automação – Em paralelo à evolução do uso do gás, a tecnologia dos queimadores também se desenvolveu bastante nos últimos anos. Para garantir ao cliente operação contínua em um processo com grau de risco elevado, em razão da inflamabilidade do gás, os esforços de pesquisa das empresas se concentram na automação dos equipamentos.
Na tendência de automação ressalta-se, em primeiro lugar, os controles sobre a regulagem de temperatura, de estanqueidade e de mistura ar/combustível. De maneira geral, esses comandos são feitos por meio de painel de controle convencional. O próximo passo nessa evolução é tornar o controle microprocessado por sistema por chip eletrônico. Bastante envolvida nessa tecnologia está a Weishaupt, detentora de patente em microprocessadores para queimadores de pequeno porte (em fase de caducidade) e de médio e grande porte.

“A grande vantagem do controle microprocessado é substituir o emaranhado de engrenagens mecânicas do queimador por um sistema constituído por plugs e ajustado por um display”, explicou o diretor Johann Braun. “O operador deixa de usar ferramentas mecânicas para apenas apertar os botões do display”. Nesse comando, estão incluídas as regulagens das faixas de combustível e regulagem do ar, acionadas por dois motores diferentes e que proporcionam combustão mais precisa.
Lançado no Brasil no segundo semestre de 2001, o sistema da Weishaupt chama-se W-FM 100 e volta-se para aplicação nos queimadores duoblocos e monoblocos da empresa. Nos queimadores pequenos da linha W (de 12,5 a 550 kW), há um sistema similar microprocessado já incorporado em quatro dos cinco modelos existentes.
A intenção é expandir o uso do W-FM 100, em uma primeira fase, a todos os monoblocos da Weishaupt a partir deste ano, tendo em vista que o custo do investimento se equivale, em comparação ao controle convencional por painel. A linha dos monoblocos WG atende a faixa desde 60 até 10.900 kW. Com possibilidade de ser comandado via PC, o sistema vale para qualquer tipo de combustível. Até o momento, a Weishaupt já vendeu desses queimadores para dois clientes no Brasil, cada qual com três equipamentos: a Multibrás, em Joinville-SC, e a Alpargatas, em Recife-PE.