Petroquímica: Falta de água complica os planos do pólo paulista

Com perspectivas de escassez a curto prazo, o pólo petroquímico de Capuava entra em clima de disputada para decidir se utiliza água de reuso ou se inicia as obras Aquapolo

Química e Derivados: Petroquímica: . ©QD Foto - Cuca JorgeAcostumado a processar um sem-fim de insumos químicos, muitos deles complexos e perigosos, pode soar contraditório saber que o pólo petroquímico de Capuava, em Mauá-SP, tem como principal problema garantir-se do abastecimento da simples e elementar água. Mas é exatamente isso o que ocorre à central de matérias-primas, a Petroquímica União (PQU), e às demais dez empresas do pólo, que temem em breve ficar sem fornecimento suficiente para seus planos de expansão e até mesmo para tocar o dia-a-dia em uma indesejável pespectiva de estagnação.

Química e Derivados: Petroquímica: Rio Tamanduateí passa pela Recap, mas vai perder vazão. ©QD Foto - Cuca Jorge
Rio Tamanduateí passa pela Recap, mas vai perder vazão.

Atualmente, o pólo baseia seu abastecimento de água na Refinaria de Capuava (Recap), da Petrobrás, responsável pelo tratamento do manancial captado do Rio Tamanduateí, que perpassa seu terreno e do qual possui outorga para retirar 1.300 metros cúbicos por hora. O problema é que cerca de 75% da água captada para abastecer as petroquímicas se origina do esgoto da cidade de Mauá. Com o firme aceno do saneamento básico chegar à região, fato próximo de ocorrer em virtude das metas de universalização que a nova concessão privada de Mauá (Ecosama) precisa cumprir sob contrato, o rio deixará de ter vazão para atender a demanda atual das empresas, visto que não receberá mais os despejos domésticos e industriais hoje lançados indiscriminadamente.

“O conselho de acionistas da central quer uma definição ainda neste ano sobre que plano vamos colocar em prática para garantir o abastecimento”, afirmou o gerente de projetos da PQU, Jorge Rosa. E é para atender a essa urgente imposição que os encarregados da tarefa estão próximos da solução. Em um trabalho liderado pela PQU, principal interessada por ser responsável pelo consumo de 680 m3/h de água, de um total de 1.100 m3/h consumidos no pólo, em breve será definido um novo projeto de abastecimento de água. A escolha recairá sobre uma das duas seguintes opções: o comentado projeto Aquapolo, que propõe trazer água do Rio Tietê, coletada em seu trecho de Suzano-SP; ou então a opção pela água de reuso, isto é, recuperada de esgoto e fornecida por companhias de saneamento.

Mas a definição está longe de ser apenas uma simples escolha entre dois projetos viáveis. Por serem obras complexas e milionárias, numa região com um dos mais caros metros cúbicos de água do Brasil (média de R$ 4), elas devem gerar ainda muita polêmica. A maior controvérsia permeia justamente a opção em que o pólo mais se inclina a adotar, a de água de reuso, que tem a possibilidade de ser ofertada por duas companhias de saneamento: pela Sabesp, por meio de sua Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) ABC, e pela concessionária privada de serviços de esgoto de Mauá, a Ecosama, por meio do projeto Sanear, que contempla a construção de uma estação de tratamento ao lado da Recap, em terreno já adquirido.

Briga no reuso – Há uma disputa de bastidores atrasando a tomada de decisão pelo reuso. O impasse começou quando a PQU decidiu, depois de estudar as duas possibilidades, a não depender apenas de um fornecedor. “Entendemos ser desconfortável para o pólo ficar na mão de uma única fonte”, afirmou o gerente Jorge Rosa. A posição da PQU foi formalizada por meio de uma carta de intenções enviada à Ecosama. A formalização aí foi necessária porque quando houve a concessão dos serviços de esgoto em Mauá, cuja concorrência pública em 2002 foi vencida pela construtora baiana Gautama, houve uma espécie de entendimento mútuo de que o pólo compraria a água de reuso da cidade.

Essa nova posição liderada pela PQU não agradou os planejadores da prefeitura e da concessionária de Mauá. É simples entender o descontentamento, visto que a concessão foi montada em cima da confiança em ter o pólo petroquímico como fiel cliente e, sobretudo, como principal viabilizador financeiro da obra. A venda da água de reuso daria o retorno sobre o investimento necessário para promover a universalização do tratamento de esgoto da cidade em um prazo não muito longo.

Embora o pólo não afirme desprezar a água da Ecosama, a menção a um outro novo ponto levantado pode deixar dúvidas. Isso porque faz parte também da nova intenção do pólo bancar os investimentos para viabilizar o outro projeto aventado em reuso: a compra do esgoto da Sabesp. Trata-se de obra avaliada em cerca de R$ 50 milhões, que consiste em construir uma tubulação de 14 km, interligando a ETE ABC situada no bairro do Sacomã, em São Paulo, com a Refap, e ainda uma estação elevatória na unidade da Sabesp. “Temos várias opções de financiamento”, diz Jorge Rosa.

A companhia de saneamento paulista, aliás, é a que tem a posição aparentemente mais passiva na história. Seu único trabalho seria permitir ao pólo buscar e comprar seu esgoto secundário, aquele que passou por tratamento preliminar com grades e caixa de areia, para remoção de sólidos grosseiros, seguido por uma decantação primária para adensamento de sólidos em suspensão, e por um tratamento biológico em tanques de aeração antes da decantação final para clarificação. Apenas vender esse esgoto é um ótimo negócio. Além de não precisar investir, e também não polir o efluente para uso industrial (o que será feito na Recap), a Sabesp venderá por cerca de R$ 2,50 o metro cúbico do esgoto tratado, que até então vinha sendo descartado no rio.

Química e Derivados: Petroquímica: ETAs na Recap tratam 1.200 m3-h da água poluída do rio . ©QD Foto - Cuca Jorge
ETAs na Recap tratam 1.200 m3-h da água poluída do rio .

Mesmo sem o pólo afirmar preferir o reuso da Sabesp, o simples surgimento dessa opção pode indicar uma tendência. Apesar de precisar investir, ao contrário do caso da Ecosama que bancaria suas obras com financiamento da Caixa Econômica Federal, as indústrias garantiriam com a ETE do governo do Estado água por muito tempo, segundo explica o gerente de projetos da PQU, Jorge Rosa. Na sua estimativa, quando todos os esgotos da região do ABC estiverem sendo tratados na ETE, haverá uma vazão de 3 m3/s, o que dará de sobra para a demanda atual do pólo (350 litros/s) e para a estimada na expansão (0,5 m3/s). E o melhor é saber que a universalização dos serviços de coleta e tratamento de esgoto da Sabesp na região está em curso. Atualmente já é tratado cerca de 1 m3/s e até o final do ano estima-se que esse número deva dobrar.

A mesma confiança na disponibilidade de água de reuso da Sabesp Jorge Rosa não demonstra pelo da concessionária de Mauá. Para ele, além do fato de o projeto ainda estar no papel, para chegar às necessidades advindas das futuras ampliações do pólo a Ecosama precisaria contar com 100% da rede coletora de esgoto na cidade, o que de acordo com o gerente ainda está longe de ocorrer e demanda alto investimento. “Em virtude da nossa pressa em resolver o problema, entendemos que a opção ainda não se mostra muito concreta”, diz.

A opção de Mauá – Não tem o mesmo posicionamento da PQU, logicamente, a Ecosama. De acordo com seu diretor geral, Dagoberto Antunes da Rocha, o projeto acordado com a prefeitura para tratar o esgoto da cidade, denominado Sanear, está em fase final de liberação de recursos na Caixa Econômica Federal, em um montante de R$ 60 milhões.

Química e Derivados: Petroquímica: Rosa - se optar pelo reuso,pólo não dependerá só de um fornecedor. ©QD Foto - Cuca Jorge
Rosa – se optar pelo reuso,pólo não dependerá só de um fornecedor.

A quantia será empregada para a construção da estação de tratamento de esgoto para fins industriais, situada ao lado da Recap, estrategicamente localizada em um terreno de 45 mil m2 logo após o ponto de captação da refinaria no Rio Tamanduateí.

A estação terá capacidade total de esgotamento para 1.080 litros por segundo, meta a ser atingida em sete anos, com a coleta ampliada do esgoto da cidade. Nos três primeiros anos, segundo Rocha, há possibilidade de se atingir 530 litros/s, a partir de uma primeira fase operando a 350 litros, justamente para atender à demanda atual do pólo.

Esses investimentos seriam paralelos a outros para expansão da rede coletora de esgoto (atualmente 60% da cidade é atendida) e em um coletor-tronco (que levaria parte do esgoto para um interceptor que segue até a ETE ABC). “Todas essas metas foram estabelecidas em comum acordo e com base nas necessidades das petroquímicas, e precisarão ser atendidas em respeito ao contrato de concessão [de 30 anos]”, explica o diretor da Ecosama.

A outra observação de que o projeto ainda não está muito definido também recebe resposta do diretor Dagoberto Rocha. Segundo ele, após a liberação do dinheiro da Caixa, a chamada estação de produção de água para fins industriais (EPAI), da Ecosama, pode ser construída em 18 meses. A rapidez se explica pela não-complexidade da obra. Ela contemplará apenas o tratamento primário, com gradeamento fino, e o secundário (biológico), este um sistema diferente com aeração prolongada com balancins móveis, chamado Biolac e da empresa americana Parkinson.

Química e Derivados: Petroquímica: Rocha - reuso de Mauá sairia mais em conta. ©QD Foto - Cuca Jorge
Rocha – reuso de Mauá sairia mais em conta.

As obras demorariam um pouco mais caso seguissem o projeto original acordado no contrato de concessão. Para ganhar a concorrência, a Ecosama precisou ofertar um sistema que tivesse também a preparação final da água para uso industrial, visto que a prefeitura de Mauá já havia concebido o projeto de concessão com a idéia de deixá-lo viável por meio da venda da água industrial. Isso fez o projeto englobar ainda um tratamento físico-químico e o polimento final com osmose reversa para adequar a água para alimentação de caldeiras. Com a mudança de posicionamento do pólo, que passou a achar por bem comprar apenas o efluente secundário, a Ecosama precisou diminuir o espectro de tratamento da estação.

Com a água de reuso de Mauá o pólo não precisa fazer investimentos, à exceção do polimento final que prefere continuar a fazer na Recap. Inclusive se optasse pela opção anterior de comprar a água pronta, pelo menos de acordo com as informações do diretor geral da Ecosama, poderia até ter vantagens. Enquanto o efluente secundário da Sabesp tem preço estimado em R$ 2,50 o m3, Rocha afirma que venderia a água pronta para uso industrial, já desmineralizada, por R$ 2,20/m3. Já o efluente secundário, que está nos planos da petroquímica, a Ecosama acredita vender por R$ 1,20. Um dos motivos do baixo preço é a logística. “Estaremos a 200 metros da Recap”, diz.

Cara e problemática – Os impasses para a adoção da água de reuso pela petroquímica paulista não terminam pelos desencontros institucionais. Há ainda um outro aspecto, de ordem política, que deve ajudar a aumentar o imbróglio. Com a recente confirmação de que o marco regulatório nacional do saneamento deixou a titularidade do sistema nas mãos do município, a PQU pode encontrar problemas caso prefira recorrer à Sabesp. O motivo é óbvio: como quem tem o controle sobre os serviços de água e esgoto no pólo é a prefeitura de Mauá, esta tem o poder de vetar a negociação entre a estatal e as empresas. Isso sem falar que pelo contrato público que originou a Ecosama, apenas a concessionária pode vender água de reuso no município.

Não fica difícil, portanto, imaginar mais obstáculos para a concretização dessa que é uma saída inteligente para o gerenciamento da água, sobretudo em uma região problemática como São Paulo. Utilizar água potável para fins industriais, como hoje indiscriminadamente se faz (inclusive no pólo, que ainda precisa para diluir e acertar a qualidade final da água recuperada do Tamanduateí), torna-se no mínimo um contra-senso. É evidente que por princípio a água foi potabilizada para permitir seu uso por seres humanos e não por máquinas.

Até mesmo o ponto de vista oficial da PQU é optar pelo reuso em conseqüência de seu caráter “ambientalmente mais correto”, segundo afirmou Jorge Rosa. Isso porque, ao se pensar em termos de custos, trata-se de opção mais cara. Conforme diz, para realizar o tratamento complementar do efluente, o custo operacional se elevaria em até 70%. No caso da água de reuso da Sabesp, o problema seria maior, porque viria de esgotos domésticos e industriais de várias procedências, com uma infinidade de contaminantes remanescentes. O da Ecosama, em uma primeira fase, seria o mesmo e ruim oriundo do Tamanduateí, mas com o passar do tempo ao provir de outros esgotos também complicaria o polimento na Recap.

Pela lógica exclusiva do custo, a propósito, o preferível para o pólo seria continuar do jeito atual. Se não houvesse o risco iminente de desabastecimento, seria melhor manter a compra de água potável da Sama (companhia pública de saneamento de Mauá) por R$ 3,50 o metro cúbico (até há pouco tempo era R$ 4,50), utilizada para ser misturada à água tratada do Tamanduateí em percentuais desde 10% no verão, com chuvas, até 30% no inverno e, em casos de maior estiagem, em até 50%. Além de, no final das contas, ficar mais barata, por não demandar mais obras não precisaria do longo prazo de até 15 anos para amortizar o investimento, como ocorrerá com o reuso.

Aquapolo é back-up – Mesmo não se preocupando com o custo alto do reuso, a boa vontade ambientalista do pólo também tem limites. Caso os enfrentamentos institucionais se agravem, a necessidade de encontrar uma nova fonte de água, já que em breve a PQU pretende expandir sua produção de 500 mil t de eteno para 700 mil t, deve fazer a escolha recair sobre o tradicional projeto Aquapolo. “Se o reuso não sair, começamos imediamente as obras”, avisa Jorge Rosa. O projeto, segundo ele, já está com as duas licenças ambientais aprovadas (prévia e de instalação), com a engenharia pronta e, melhor ainda, com o financiamento de R$ 40 milhões garantido. Isso sem considerar que a outorga de três anos para captação, concedida pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE), já foi renovada uma segunda vez, desde o nascimento do projeto há cinco anos.

O Aquapolo proporciona uma água até mais econômica, a um custo em torno de R$ 1,50 o metro cúbico, e suficiente para as ampliações, pois a outorga é para 500 litros por segundo. A obra também não seria complicada, poderia ser feita em um ano por tratar-se apenas de uma adutora com tubulação de 28 km, nas faixas de servidão dos dutos da Petrobras, até as estações de tratamento da Recap. Segundo Rosa, o Aquapolo é uma opção substituta concreta, apesar de muitos o considerarem engavetado. Prova é já terem sido gastos nele, com a engenharia e as licenças ambientais, cerca de R$ 2,5 milhões.

Mas há quem sugira no mercado de que o Aquapolo não é tão concreto assim. Pelo contrário, seria a dúvida quanto a seu futuro a motivadora dos planos do pólo petroquímico em adotar a água de reuso. Gente com experiência no mercado de saneamento básico comenta que a viabilidade do projeto corre risco em virtude da crescente escassez de água para abastecimento na região metropolitana de São Paulo. Isso significa que as necessárias outorgas para exploração do trecho do Tietê, concedidas pelo DAEE, podem não ser facilmente renovadas. Esse local de captação poderia vir a ser utilizado pelo Estado a qualquer momento e a petroquímica perderia seu investimento.

Esse risco aventado no mercado tem sentido, pois sabe-se que a região metropolitana de São Paulo precisa trazer água de regiões cada vez mais longínqüas e além disso há previsões sérias de que em 2010 a oferta já não será suficiente para atender todo o consumo paulista. Embora oficialmente o pólo não considere a hipótese, visto que segundo Jorge Rosa a Sabesp não se interessa por esse trecho do Tietê para potabilização, o afã em adotar a água de reuso pode sugerir o contrário.

Química e Derivados: Petroquímica: Lopes - refinaria não usa a rede da concessionária. ©QD Foto - Cuca Jorge
Lopes – refinaria não usa a rede da concessionária.

Recap trabalha para racionalizar o seu tratamento de água

Não é só no aspecto político que os colaboradores do pólo de Mauá estão se movimentando para tentar diminuir os riscos de um temido desabastecimento de água. Conscientes há algum tempo de que o preço e a pouca disponibilidade do insumo já são fatores de perda de competividade, visto que sua limitada fonte gera uma água até três vezes mais cara em comparação a dos outros dois pólos petroquímicos do País, os profissionais de Capuava se esmeram também tecnicamente para minimizar os impactos negativos.

Responsável pelo tratamento e o abastecimento de água para as empresas do pólo, a Refinaria de Capuava (Recap), da Petrobrás, é o símbolo maior de todo esse esforço. Empenhada em reduzir o consumo e introduzir tecnologias para melhorar o gerenciamento da água, a Recap chegou até a criar recentemente um grupo de trabalho, o Gota (sigla de “grupo de otimização da água”), para coordenar a tarefa.

Apesar da má fama que os grupos de trabalho normalmente têm, este já demonstra bons resultados. Uma primeira conquista foi permitir à Recap não precisar mais utilizar a água potável comprada da Sama para diluir a empregada no processo de refino e em resfriamento. “Somos a única unidade do pólo que usa a água da rede concessionária apenas para uso humano”, comemora o gerente da área de utilidades da Recap, Mauro Lopes.

Os outros ganhos, para Lopes, virão como conseqüência dos trabalhos. “Criamos um grupo multidisciplinar que tem sugerido não só o estudo de tecnologias como técnicas para conservação, reuso e reciclagem de água”, afirmou. Um ponto importante e já em andamento são as auditorias de possíveis focos de desperdício, tanto nas áreas industriais como prediais.

Química e Derivados: Petroquímica: Jardim aprovou o dióxido em períodos de chuvas. ©QD Foto - Cuca Jorge
Jardim aprovou o dióxido em períodos de chuvas.

Mas o Gota é só a mais nova das ações da Recap em água. O principal mesmo, em termos de otimizações, vem sendo feito nas estações de tratamento. Também não é para menos, pois delas dependem todas as onze empresas do pólo e trata-se de tarefa difícil. Como já foi mencionado, o Rio Tamanduateí, de onde a Recap tem outorga para captar 1.300 m3/hora, é constituído em cerca de 75% de sua vazão de esgotos in natura, lançados logo no início de sua nascente, situada na gruta de Santa Clara, em Mauá, a apenas 5 quilômetros da refinaria.

A Recap divide a sua operação em duas ETAs (estações de tratamento de água), alimentadas também por duas represas que recebem a “água” do rio. A represa 2 atende a ETA 2, responsável pelo abastecimento da PQU, Polietilenos União, White Martins e União Química. Nela são tratados 750 m3 por hora. Já a represa 1, que recebe água da represa 2, alimenta a ETA 1, por sua vez responsável pela produção de 450 m3 por hora que abastecem a própria Recap, a Oxiteno, a Polibrasil e a Oxicap.

O trabalho para administrar a poluída água do Tamanduateí, rio classe 4, é evidente. Por receber não só efluentes domésticos, mas também industriais, o grau de complicação aumenta. Há contaminantes extremamente difíceis de serem tratados, como a amônia, resultante dos descartes domésticos, que chega a teores elevadíssimos de até 130 ppm e em média fica em torno de 70 ppm. O ideal seria o teor de amônia estar próximo de zero, para não afetar com sua alta corrosividade os equipamentos. O outro complicante com importância é a elevada contaminação microbiológica, com DBO de 150 mg/l.

Essa crescente contaminação orgânica faz a refinaria precisar muitas vezes renovar-se em tecnologia. Um exemplo mais recente ocorreu porque o gás cloro normalmente utilizado para desinfecção e clarificação da água de entrada das estações começou a não funcionar a contento. A saída foi buscar um oxidante mais forte. Ainda em teste, uma alternativa com boa aprovação, e provavelmente a ser adotada oficialmente, é o dióxido de cloro.

Química e Derivados: Petroquímica: Dióxido de cloro na Recap - só não reage com amônio. ©QD Foto - Cuca Jorge
Dióxido de cloro na Recap – só não reage com amônio.

Especificamente na ETA 1, onde são tratados 450 metros cúbicos, a Recap instalou um gerador de dióxido de cloro líquido, da empresa Prominent, o qual produz o oxidante a partir de ácido clorídrico e clorito de sódio. O produto passou a ser empregado em conjunto com o coagulante PAC (policloreto de alumínio), fornecido pela Clariant, substituto do sulfato de alumínio com a vantagem de ser menos dosado (1/3 do outro) e de aglutinar melhor os sólidos suspensos. “Ganhamos uma água de melhor qualidade, elevando os ciclos de concentração das torres, diminuindo a necessidade de limpeza de trocadores de calor e gerando menos lodo”, lembrou Mauro Lopes.

O dióxido de cloro e o PAC vão permanecer em teste na ETA 1 até o fim do ano, para completar um estudo de sazonalidade de operação. Isso se faz necessário porque a Recap já percebeu que em períodos de estiagem o gás cloro ainda é imbatível, época em que o teor de amônia sobe muito por não ser diluído na chuva. “O dióxido de cloro não reage com a amônia”, lamenta o coordenador da área de sistemas de água da refinaria, Alfredo Jardim. Apesar de preferir deixar de usar o cloro, que precisa ser transportado de caminhão desde Cubatão-SP (da Carbocloro Oxypar), representando mais custo e perigo logístico, o gás deve ser mantido no futuro para combater o indesejável contaminante. “Pelo menos quando não chover”, completa.

Química e Derivados: Petroquímica: Kallervo tenta vender tecnologia de ozonofiltração. ©QD Foto - Cuca Jorge
Kallervo tenta vender tecnologia de ozonofiltração.

Os técnicos da Petrobrás prometem mais novidades para melhorar o tratamento de água de Capuava. É uma meta do grupo de estudo Gota incluir outras tecnologias nas duas estações. Estão sendo feitos estudos de custo-benefício, por exemplo, das tecnologias de desinfecção por raios ultravioleta ou por geração de ozônio. “A idéia é complementar com novas técnicas o que já desenvolvemos até agora, para ficar cada vez menos dependentes de situações externas e garantir água para as futuras ampliações do pólo”, diz Mauro Lopes.

Ozonofiltração – Esse propósito da Recap tem atraído o interesse de muitos fornecedores de tecnologia, que são chamados para apresentar soluções para otimizar o tratamento.

Uma dessas empresas é a fornecedora de geradores de ozônio e de flitros especiais Okte, de São Paulo. Um projeto da empresa apresentado na refinaria contempla o pré-tratamento de 1.500 m3/hora – 1.200 m3 oriundos do Tamanduateí e 300 m3 de reuso do efluente da Recap – da água que segue para as lagoas.

Segundo explica o diretor da Okte, Olli Kallervo, a engenharia envolve seis colunas de oxidação alimentadas com um gerador de ozônio de 250 kg/hora, complementadas com uma estrutura de concreto de filtros de areia por gravidade. Esses filtros foram adaptados recentemente pela Okte para uso conjugado com ozônio, a partir de um projeto antigo da empresa americana Permutit, dando origem a uma tecnologia denominda pela empresa como ozonofiltração. Trata-se de filtro autolavável que trabalha continuamente, sem válvulas, funcionando por meio de sistema de sifão.

Kallervo afirma que a vantagem da possível aplicação de um sistema de ozônio, em uma água de alimentação problemática como a do Tamanduateí, é seu alto poder oxidante, maior do que quase todos os disponíveis. Além de remover vários poluentes, desde compostos orgânicos complicados, como fenóis e detergentes (este último um problema na Recap), até inorgânicos, como cianetos e nitritos, o ozônio também serve como auxiliar na microfloculação, gerando flocos que depois são retidos nos filtros de areia.

Também conta a seu favor a redução de trialometanos, gerados por seu oxidante concorrente, o cloro. Essa amplitude de atuação da ozonofiltração da Okte fez a empresa também ofertá-la em unidades pequenas, para potabilização de água em comunidades.

Triunfo prepara expansões para atender mercado em crescimento

Fernando de Castro

Química e Derivados: Petroquímica: Alencar - novas aplicações influenciam a retomada. ©QD Foto - Cuca Jorge
Alencar – novas aplicações influenciam a retomada.

As novas alternativas para aplicações de resinas, a expectativa de crescimento da renda per capita da população e o aumento das exportações impulsionam a indústria petroquímica em 2004 e deverão garantir seu crescimento acima do PIB nacional. Nos primeiros três meses foram produzidas mais de 880 mil toneladas, superando as 860 mil do primeiro trimestre de 2003. No mesmo tom, os principais players do Pólo Petroquímico de Triunfo, no Rio Grande do Sul, recebem investimentos, inclusive para ampliação da capacidade de processamento dos derivados da nafta. A partir de julho a Braskem aumentará em 100 mil toneladas/ano de polipropileno a sua capacidade de produção no pólo. A Ipiranga Petroquímica voltou a bater seu recorde mensal de produção, agora fixado em 53 mil toneladas por mês, levando em conta as três resinas que fabrica – o polipropileno, o polietileno de alta densidade e o polietileno de baixa densidade linear. São três mil toneladas a mais em relação à mesma média do ano passado, também recorde. A Innova prepara-se para aumentar a quantidade de estireno, reduzindo em dois terços a necessidade de importação do monômero pelo Brasil.

Para Alexandrino Alencar, vice-presidente de relações institucionais da Braskem, as perspectivas da petroquímica brasileira a partir do surgimento de novas aplicações, como o aumento do uso de lonas de polietileno para revestimento de reservatórios e tanques de aqüicultura, a substituição do amianto pela fibra de polipropileno na confecção de caixas da água, e o crescimento do uso do PP e PVC para a confecção de tubulações para irrigação de lavouras, já não são mais uma expectativa, mas uma realidade. Ele salienta o crescimento acima de 10% dessas resinas, nos últimos meses, no Centro-Oeste, voltado justamente para o uso em agricultura, embora o consumo da região seja bem inferior ao do Sul e Sudeste, as duas principais áreas consumidoras.

Conforme Alencar, existem boas perspectivas também para as embalagens de frutas e para a crescente substituição dos vidros de requeijão por recipientes à base de resinas de PP. “As previsões da petroquímica são promissoras”, assinala Alencar. Segundo ele, o segmento deverá crescer de duas a três vezes em relação ao PIB brasileiro em 2004, lembrando que o consumo de resinas já obteve um acréscimo de 3% nas vendas nos quatro primeiros meses do ano, quando comparada com a média de 2003.

Química e Derivados: Petroquímica: Markus - recorde da Ipiranga visa atender exportações. ©QD Foto - Fernando de Castro
Markus – recorde da Ipiranga visa atender exportações.

De olho nesse crescimento, a Braskem irá ampliar de 550 mil toneladas/ano para 650 mil a produção de polipropileno de sua unidade de Triunfo. Já a sua fábrica de PVC em Alagoas, de 240 mil toneladas ano, irá ofertar mais 50 mil. Alexandrino Alencar aponta como outro fator de desenvolvimento da petroquímica a entrada em operação da Rio Polímeros em 2005, produzindo resinas a partir do gás natural.

O vice-presidente adiantou ainda que a Braskem e a Petrobrás estão adiantadas nas conversações para a construção de uma nova unidade de polipropileno em Paulínia, São Paulo, com capacidade para 250 mil toneladas/ano, a partir de 2006.

Para Geraldo Markus, responsável pelas áreas de marketing e exportações da Ipiranga, os números de 2004 evidenciam crescimento, mas aquém da expectativa, por conta do consumo fraco no mercado interno.

Em sua opinião, fica difícil comparar porque, entre janeiro e fevereiro de 2003, os transformadores resolveram realizar grandes pedidos com receio de desabastecimento da nafta às vésperas da guerra no Iraque e antevendo um aumento dos preços pelo mesmo motivo. O executivo explica a produção recorde da Ipiranga pelo aumento das exportações.

Nos últimos anos, o grupo gaúcho reforçou suas vendas no mercado externo, com ênfase no Mercosul, Europa e África. Com isso, as exportações passaram de 35% para 45% do faturamento e poderão aumentar ainda mais se, em algum momento, a demanda nacional por resinas arrefecer. “Quem tem capacidade para exportar está exportando, mas o mercado interno tem de ser a âncora porque as vendas ao exterior apresentam baixa margem de lucro e desencorajam investimentos em modernização”, adverte Markus.

Mais estireno – A Innova irá colocar mais 60 mil toneladas de estireno no mercado brasileiro a partir de 2005. Embora a planta industrial da empresa já tivesse capacidade para produzir 250 mil toneladas/ano do monômero, existiam dois obstáculos para ocupá-la: a Copesul (central de matérias-primas do pólo) não tem eteno para repassar na quantidade necessária, e a capacidade da própria Innova em produzir o intermediário etilbenzeno é limitada em apenas 190 mil toneladas/ano.

Química e Derivados: Petroquímica: Numes - mais estireno no Brasil a partir de 2005 . ©QD Foto - Fernando de Castro
Numes – mais estireno no Brasil a partir de 2005 .

O problema foi resolvido no âmbito do Mercosul. A Petrobrás Energia, subsidiária argentina da estatal brasileira que absorveu a petroleira Pérez Companc (antiga dona da Innova), reativou um cracker no país vizinho, onde possui também uma unidade com capacidade de 250 mil toneladas de etilbenzeno.

Como a empresa no país vizinho pode produzir apenas 110 mil toneladas/ano de estireno, a Innova receberá de lá as 60 mil toneladas/ano do intermediário que faltam para ocupar totalmente a fábrica gaúcha de estireno. Nas contas do gerente de vendas Luciano Nunes Rolla, a empresa é a maior fabricante do produto dentro do mercado nacional e quando passar a produzir a plena carga irá reduzir para 30 mil toneladas/ano as importações do produto, que atualmente estão em 90 mil. “O mercado de estireno é cativo e cresce sem parar, há vários anos”, informa Luciano Nunes, referindo-se à produção própria de poliestireno.

Neste ano, explica Luciano Nunes, a percepção de aquecimento dos negócios com o PS por conta do mercado de eletrodomésticos é evidente devido ao grande movimento de exportação desses produtos. Ele informa que no caso do poliestireno, os transformadores compraram todo o estoque do primeiro trimestre e prosseguiam com as encomendas da resina no segundo.

“Neste momento, existe uma recuperação da massa salarial do trabalhador e a expansão do crédito por conta da queda dos juros nas compras de longo prazo. Com isso, ele prevê o reaquecimento do mercado consumidor do país que deverá absorver em 2004 300 mil toneladas , 30 mil a mais na comparação com o ano passado, considerado fraco, e só
5 mil toneladas a mais em relação com 2002.

De qualquer forma, é um período de vendas altas com margens em baixa, por culpa do benzeno, a matéria-prima básica na obtenção do poliestireno. O aromático ficou caro, pois escalou a planilha de custos, sem dó nem piedade, dos US$ 300 a tonelada para US$ 900 nos últimos 12 meses e, no fechamento desta edição, encontrava-se estabilizado em inflados US$ 750. “Neste segundo semestre crescemos em cima de três fatores: reaquecimento do consumo interno, alta das exportações e formação de estoques reguladores pela indústria de transformação”, resume o executivo.

Estoques esgotaram – O presidente do Sindicato da Indústria de Materiais Plásticos do Rio Grande do Sul, Hugo Doormann, confirma as informações dos executivos da indústria de segunda geração. Os transformadores compraram todo o estoque produzido dos três primeiros meses do ano. A partir daí, reconheceu, o mercado enfrentou queda novamente. Para Doormann, o movimento inicial em busca de olefinas indica a formação de estoques pelos transformadores, como forma de se protegerem da alta da nafta, conseqüência natural da instabilidade do preço do petróleo.

“Nós podemos fazer estoques reguladores. É absolutamente normal o transformador comprar as resinas antes do repasse dos preços para que seus produtos se mantenham mais competitivos por mais tempo”, exemplifica o empresário. Quando comenta as projeções para o segundo semestre, Doormann também se diz otimista prevendo um ano bom para os negócios, confiando no reaquecimento do mercado interno.

Desempenho americano favorece retomada local

Química e Derivados: Petroquímica: Fraquelli - produção nacional atenua atenua alta de preços. ©QD Foto - Fernando de Castro
Fraquelli – produção nacional atenua atenua alta de preços.

Na ótica de Antônio Carlos Fraquelli, da Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul, os bons ventos do PIB brasileiro estão garantidos e sopram da América do Norte. Ele sustenta sua opinião em cima do reaquecimento da economia norte-americana, nos últimos meses. “Os Estados Unidos são o motor da economia mundial. Se eles crescem todos pegam carona, mesmo que os índices não se igualem aos da superpotência, o ambiente é de reativação, incluindo o Brasil”, prevê Fraquelli.

De acordo com o economista, nos últimos 12 meses os EUA apresentaram PIB positivo de 4,9% em média. O Japão e a Europa, com inflação controlada, estão crescendo no vácuo do carro-chefe inclusive com juros baixos. O dólar se desvaloriza. A moeda chinesa está ancorada e registra queda em junho. “O Japão se desfaz das suas reservas cambiais na casa dos US$ 800 bilhões.

A Europa mantém o euro sobrevalorizado e enfrenta dificuldades para exportar, pois não tem a mesma agilidade dos EUA para administrar as taxas de juros e porque qualquer mudança depende de consulta e aprovação dos países membros”, explica Fraquelli. Por conta disto, neste momento, existem alguns países ainda em apuros, como a Alemanha, com evolução do PIB a 1,5% e taxa de desemprego de 10,5%.

Ao comentar o cenário específico da cadeia do petróleo, Fraquelli adverte: a tendência é de preços altos, pressionando inflação para cima e os juros também: “É um cenário de crescimento, mas com pressão inflacionária e juros subindo”. No caso do Brasil, como existe a tendência de aumento da produção nacional, esses efeitos podem ser atenuados. Como a economia dos EUA irá crescer por conta na necessidade do governo Bush em responder ao eleitorado, o consumo de petróleo vai aumentar naquele país.

“Se os parceiros de Bush na Opep decidirem bombear mais óleo bruto por conta própria, às vésperas do pleito, tal iniciativa poderá definir a disputa a favor de Bush. Os Estados Unidos consomem 45% dos derivados de petróleo processados no mundo, portanto a pressão sobre os preços é inevitável. Há muita incerteza no cenário mundial em função da instabilidade do Oriente Médio”. Para Fraquelli, o preço do petróleo ainda poderá ficar abaixo dos US$ 35, desde que o principal aliado norte-americano no cartel da Opep, a Arábia Saudita, consiga maioria para aprovar a favor do aumento da produção. “No momento há uma disputa pela política de preços entre Arábia Saudita, principal aliada dos EUA, com a oposição de adversários de George W. Bush, como a Venezuela e a Nigéria. O Catar, junto com o Irã e os Emirados Árabes estão em cima do muro”, informa Fraquelli.

A crise do preço do petróleo, no entendimento do economista, também está relacionada pelo esgotamento da política de bandas adotada em 2000 quando o barril era cotado entre US$ 22 e US$ 28. “Em 2004, já chegamos a um pico acima dos US$ 40 com oscilações para baixo. Mas há uma conjuntura no cenário político completamente adversa proporcionada pelo terrorismo e a intervenção no Iraque. No dia 1º de junho de 2004 o barril foi cotado a US$ 38,70 e a produção mundial chegou a 25 milhões de barris, um número alto, e mesmo assim o preço não caiu na mesma proporção.”

Com isso, na visão de Fraquelli, maiores movimentações na indústria petroquímica brasileira em relação à compra de empresas, fusões, trocas de controle acionário dependem muito da reforma microeconômica, pois quem estiver disposto a comprar ativos no setor quer realizar os negócios com as regras do jogo mais claras. “O acerto definitivo da economia brasileira agora passa pelo chamado realinhamento microeconômico, com a aprovação da lei de falências, normas mais ágeis para o financiamento imobiliário, defesa da concorrência, spread bancário mais baixo, desoneração das folhas de pagamento, e regras claras para a abertura e fechamento de empresas”, apregoa.

No entendimento de Fraquelli, este ano encerra um período de desaquecimento econômico internacional iniciado já no começo de 2001 quando a queda dos valores das ações na Nasdaq e na Dow Jones, reforçada pelos ataques de 11 de setembro, sepultou um período de euforia do mercado mundial marcado pelo surgimento da chamada nova economia. Até ali, o Brasil vinha crescendo a 4% e se encontrava em 8º lugar no ranking mundial das economias em crescimento, porém sofreu os reflexos das mudanças na política cambial e despencou para o 15º lugar. “Naquela época o País ainda tinha um câmbio competitivo, mas não havia mercado comprador devido ao processo de recessão nos Estados Unidos e na Europa,” justificou Fraquelli.

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