Perspectivas 2011 – Infraestrutura – Sem receber volume adequado de recursos, setor é o maior freio ao desenvolvimento
As deficiências brasileiras em infraestrutura são notórias, mas sua correção se arrasta por décadas. Embora lamentável, essa situação representa um potencial gigantesco de negócios para as empresas ligadas a produtos e serviços desse setor, que abrange segmentos diversos, entre eles transportes, saúde pública, saneamento básico e indústrias pesadas (ou de base).
Enquanto comemorava a boa recuperação da economia brasileira em 2010, com uma evolução positiva do PIB estimada em 8%, o presidente do grupo Siemens do Brasil e primeiro vice-presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Adilson Primo, prognosticou para 2011 um índice de crescimento entre 4,7% e 5%. Salientou, porém, que esse avanço merece aplausos, embora seja inferior ao de 2010, resultado extraordinário explicado pela debilidade registrada em 2009.
“O Brasil não poderá crescer mais que esses 5% em 2011 e precisa começar a gastar menos e melhor”, recomendou Primo. Ele mencionou que a expectativa brasileira para 2011 é a menor entre os países do grupo Bric (Brasil, Rússia, Índia e China). Para ele, a falta de infraestrutura adequada é o maior freio ao desenvolvimento nacional.
Primo se declara otimista em relação ao futuro do país e da nova administração federal, iniciada com a promessa de ajustes. “Estamos vivendo um bom momento na economia nacional, mas precisamos de algumas reformas urgentes, sem as quais não se garante a estabilidade econômica”, avaliou. Ele ressaltou a circunstância internacional de crise, iniciada em 2008 e ainda não superada, como evidenciam os chamados Pigs (grupo de Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha, todos em situação difícil).
Na sua avaliação, o crescimento da demanda nacional está ligado ao aumento do consumo das famílias das classes C, D e E, impulsionado pelos gastos públicos e investimentos oficiais. “Só o consumo das famílias não basta, precisamos crescer desde a base, com mais infraestrutura e exportações”, afirmou. O crescimento industrial de 11% registrado em 2010 representou apenas um retorno a 2008, segundo Primo. O parque produtivo nacional opera com índices muito altos de ocupação de capacidade instalada, tornando evidente a incapacidade para suprir novos acréscimos de demanda. Ressalte-se que a implantação de novas indústrias requer um prazo de três a cinco anos.
Nesse quadro, a evolução do consumo está sendo suprida pelas importações, cada vez mais elevadas, enquanto se exporta menos a partir do Brasil. “A taxa de juros elevada atrai mais dólares para o mercado local, desequilibrando o câmbio”, criticou Primo. A relação entre o real e o dólar, ou mesmo em relação a uma cesta das dezesseis moedas dos principais parceiros econômicos do país, indica uma grave perda de competitividade do produto local desde 2003. “E esses dados não consideram os demais entraves do custo Brasil”, salientou.

Nos setores de base, as oportunidades de crescimento são claras. Segundo Primo, há uma tendência de os países desenvolvidos saírem da produção de siderúrgicos, que tomariam o rumo dos países em desenvolvimento. Nos transportes, todos os modais estão saturados, até mesmo os aeroportos, carentes de modernização e ampliação, em especial para atender ao fluxo de estrangeiros que virá ao país para a Copa do Mundo de 2014 e para a Olimpíada de 2016.
A geração de eletricidade brasileira, por exemplo, é predominantemente hidráulica, porém exige a adição de novos seis mil megawatts por ano para acompanhar a expansão do consumo. “Grande parte dessa energia nova terá outras fontes, como gás natural, biomassa, vento e outras”, avaliou o executivo. Como os investimentos tardam, o país vem há anos seguindo no limite do suprimento elétrico. Qualquer variação climática mais forte poderá gerar novos apagões, como o de 2001.
Segundo Primo, embora o governo anterior tenha duplicado os investimentos em infraestrutura, as necessidades nacionais são ainda maiores. “Além disso, sofremos com contingenciamentos de verbas, atrasos em licenças ambientais e entraves burocráticos diversos”, lamentou. Em 2010, o setor elétrico deveria ter investido R$ 28,3 bilhões, mas só conseguiu aplicar R$ 16,8 bilhões, ou seja, 59,4% do esperado.
Outro problema: os projetos de infraestrutura precisam encontrar uma fonte de investimento alternativa ao BNDES, cujos desembolsos de R$ 146 bilhões bateram no seu teto operacional. “Precisamos encontrar mecanismos alternativos de funding de longo prazo, mesmo porque as parcerias público-privadas, as PPPs, não decolaram”, alertou.
Atualmente, o setor público tem a plena liderança dos projetos de investimento em infraestrutura e indústrias de base. “O governo passado estimulou o aumento da participação pública por meio do BNDES e dos fundos de pensão das estatais, mas esse modelo está longe de ser o melhor, como atesta o projeto da usina de Belo Monte”, afirmou.
Primo entende que o setor privado poderia assumir um papel mais importante nesse cenário, porém requer estímulos. Ele avaliou como ruim o ambiente para negócios no Brasil, com regulamentações falhas e geradoras de incertezas, além de o custo de capital ser dos mais elevados do mundo. “Nessas condições, é melhor ser fornecedor de componentes do que líder de consórcio de grande porte”, avaliou.
As agências regulatórias precisam ser mais eficazes e funcionar com mais clareza para dar mais segurança aos investidores. Mesmo no caso do pré-sal, que ocupou espaço demasiado nas páginas dos jornais, a regulamentação ainda está por ser feita. “Saiu o tal marco regulatório, mas ele não foi ainda detalhado, exatamente a etapa mais complexa em âmbito normativo”, comentou.
Em escala global, o Brasil se destaca pelo tamanho do mercado interno (o oitavo), pela solidez dos bancos, pelos baixos custos da produção agropecuária e pelos seus serviços financeiros. Ao mesmo tempo, o país fica na rabeira dos rankings de taxa elevada de juros, regulação estatal exacerbada, burocracia para fazer negócios, rigidez nas relações trabalhistas e desperdício nas despesas públicas. Esses dados foram obtidos pelo Fórum Econômico Mundial e selecionados pela área econômica da Siemens.
Primo também salientou que o Brasil não buscou com avidez a inserção no cenário internacional, com participação de irrisório 1,1% no comércio mundial. Além disso, os indicadores de inovação tecnológica no país são minguados. “Menos de 3% das empresas instaladas no país são inovadoras”, afirmou. Esses números contrastam com a intenção manifesta do governo de transformar o Brasil na quinta economia mundial até 2015.
Outro gargalo ao desenvolvimento está na área de educação. “Teremos escassez de mão de obra qualificada pelos próximos dez anos, pelo menos”, avaliou Primo. Ele disse que os 35 mil engenheiros formados por ano no país são insuficientes para a demanda atual dos projetos. Como reflexo disso e do real fortalecido, ele revelou que o custo do trabalhador brasileiro para a Siemens já é o mais elevado de todas as unidades do grupo mundial. “Procuramos ser atraentes para os recém-formados, mantendo programas de treinamento concorridos, com 14 mil candidatos para cem vagas”, informou. No Brasil, 76% da força de trabalho do grupo tem menos de quarenta anos de idade.
O ano passado teve bons resultados para o grupo Siemens no Brasil. Foram faturados R$ 4.251 milhões, 10% a mais que os R$ 3.858 milhões de 2009. Foram registrados R$ 4.921 milhões em novos pedidos, com elevação de 23% sobre os R$ 4.015 milhões de 2009. “Teríamos conseguido chegar a R$ 5,4 bilhões em novos pedidos se as exportações não tivessem caído”, lamentou Primo, embora o avanço do consumo interno tenha compensado a perda.

O grupo possui 13 fábricas em atividade no país, com a previsão de modernização de várias delas, além de inaugurar outras três durante 2011. A primeira delas será a de aerogeradores, aproveitando o bom momento para investir na energia eólica. “Iniciaremos a produção com a importação de componentes que serão nacionalizados gradualmente até pelo menos 70%, o requisito mínimo para enquadramento no Finame”, disse Primo, informando que o grupo já fabrica os produtos voltados para a distribuição de eletricidade. Outra nova unidade fabricará motores elétricos, começando pela baixa tensão e avançando pela média e até alta tensão. “O cluster nacional de óleo e gás precisará de motores cada vez maiores para a exploração do pré-sal”, informou. A terceira unidade ainda está da fase inicial de projeto e será destinada a equipamentos industriais diversos.
O grupo já opera a primeira balanceadora de alta velocidade para testes de rotores da América Latina, instalada em Jundiaí-SP. Esse equipamento é especialmente interessante para a construção de turbinas a vapor, como as usadas pelo setor sucroalcooleiro. “Somando as usinas do estado de São Paulo, verifica-se um potencial de cogeração de eletricidade de dez mil MW, maior que a hidrelétrica de Santo Antônio”, comentou.
O grupo possui posições de liderança em três ramos de atividade global: indústrias (acionamentos, automação, iluminação, movimentação, entre outros), energia (geração com combustíveis fósseis e renováveis, óleo e gás, serviços de energia, transmissão e distribuição), e saúde (diagnósticos, análises por imagem e produtos clínicos). “Atuamos em três pilares: foco em inovação, aproveitamento das sinergias internas do grupo, e maior proximidade com os clientes”, afirmou.