Papel – Encontro aponta setor em crescimento, mas preocupado com a sustentabilidade

Química e Derivados, ABTCP, Encontro aponta setor em crescimento, mas preocupado com a sustentabilidade

O 43º Congresso e Exposição Internacional de Celulose e Papel, realizado de 4 a 6 de outubro no Transamerica Expo Center, em São Paulo, não serviu apenas para constatar que o setor, depois de sofrer os impactos da crise internacional, retomou o ritmo de crescimento, como deixou claro que há um longo caminho a percorrer, dada a pretensão brasileira de quase duplicar a produção atual de celulose de 12 milhões de toneladas para 20 milhões de toneladas até 2020.

Química e Derivados, Lairton Leonardi, ABTCP, importância da sustentabilidade
Leonardi: quem não investir em produção limpa vai perder o “bonde”

Segundo Lairton Leonardi, presidente da Associação Brasileira Técnica de Celulose e Papel (ABTCP), organizadora do congresso, o país só vai alcançar as metas desejadas se todos os empresários entenderem a necessidade urgente de apontar os dois olhos para a questão da sustentabilidade. Temas como tratamento de efluentes, créditos de carbono, certificações ISO/FSC, controle de poluição, sistema de gestão integrado, criação de reservas de área natural e avanço tecnológico vão dominar a pauta nos próximos anos. “Não tem o menor sentido falar de futuro, dos milhões de investimentos, das exportações, sem realçar a importância da sustentabilidade”, afirmou Leonardi, durante a palestra em que apresentou os indicadores do setor. “O empresário que não perceber que o Brasil está mudando, que é preciso investir ainda mais em pesquisas, em sustentabilidade, vai perder o bonde da história.

Os números do setor de papel e celulose são todos animadores – a produção em 2010 deve atingir 14 milhões de t (um avanço de 3,7% em relação ao ano passado) e as exportações chegarão a 6,3 milhões de t, um aumento de 25% comparado a 2009. Porém, apesar de todas as conquistas e avanços em biotecnologia, o Brasil ainda desempenha um papel tímido em relação ao seu enorme potencial produtivo. Mesmo que o setor cumpra a ousada meta de passar, até 2020, de 2,2 milhões de hectares (ha) de área plantada para 3,2 milhões, isso ainda será pouco. Hoje, existem 5,5 milhões de ha de florestas plantadas para vários usos no Brasil, o que equivale apenas a 0,2% das terras nacionais agriculturáveis.

Como crescer vertiginosamente, do­brar a produção, aumentar em um milhão de hectares a área plantada sem criar qualquer tipo de conflito com os ambientalistas? É possível, porque a produção de papel e celulose obtém 100% de sua matéria-prima de áreas de reflorestamento, formadas principalmente de eucalipto e pinus. Além disso, por meio de pesquisas de melhoramento genético, as plantações atuais de eucalipto são capazes de produzir uma média anual de 45 m³/ha – até pouco tempo atrás esse número não passava de 15 m³/ha. Esse ganho competitivo faz do Brasil um país privilegiado, capaz de produzir um milhão de toneladas por 100 mil ha, enquanto os países escandinavos necessitam de uma área de 700 mil hectares para a mesma produção de madeira.

Mas isso não significa que o Brasil está livre de pressões ambientais. Para produzir uma tonelada de papel são necessárias de duas a três toneladas de madeira, além de uma grande quantidade de água e de energia, sem falar nos produtos químicos usados na separação e no branqueamento da celulose – segundo estudos, só na polpação e no clareamento da celulose são liberados em torno de 62 milhões de metros cúbicos de efluentes.

Química e Derivados, Afonso Moura, ABTCP, setor de celulose e papel precisa aproveitar mais a biomassa de madeira
Moura: setor precisa usar biomassa de madeira para gerar energia

A importância da biomassa – Exemplos como o ocorrido na cidade uruguaia de Fray Bentos ainda estão vivos na memória de todos os empresários do setor. Durante quatro anos, a ponte que liga Fray Bentos à cidade argentina Gualeguaychú foi bloqueada por ambientalistas portenhos, que protestavam contra a instalação de uma fábrica de pasta de celulose na região. Não há casos com a mesma dimensão no Brasil, mas Afonso Moura, gerente técnico da ABTCP, acredita que o setor de celulose e papel precisa aproveitar com mais eficiência a vantagem de poder usar a biomassa de madeira e de outras matérias-primas não só para baixar o impacto ambiental, mas também para fomentar a geração de toda uma nova cadeia de negócios. Durante anos, o Brasil, segundo Moura, não fez a lição de casa, por acreditar que a energia seria para sempre abundante e barata. Já não é mais.

“Conseguimos otimizar bastante a produção, aplicando novas tecnologias, mas há muito para fazer”, afirmou Moura. “Hoje é possível produzir uma tonelada de celulose com números cada vez menores de consumo de água, mas a margem ainda é muito grande.” Até pouco tempo, era preciso de 30 a 35 metros cúbicos de água para cada tonelada de celulose – hoje esse número está em torno de 20 a 25. Moura lembrou que desde 2006, a energia obtida de biomassa cresceu 50%, somando 18% do total do consumo nacional em 2009. Durante sua palestra, o gerente técnico da ABTCP citou um estudo feito pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), que aponta no setor de papel e celulose um potencial para aumentar em pelo menos 20% a sua eficiência energética.

A geração mais eficiente de energia supriria não só o processo, mas também seria uma boa alternativa para a produção de biocombustíveis. “É fundamental para o Brasil trazer para o centro do debate a questão das biorrefinarias. Os outros países avançaram muito no desenvolvimento de tecnologias para a geração de combustíveis obtidos da celulose, algo que o Brasil não fez e está notoriamente atrasado”, afirmou Moura, que não acha, entretanto, que o país se tornará menos competitivo por causa disso. “O Brasil não as desenvolveu, mas já vai aplicá-las de imediato. Não adianta os outros países possuírem a tecnologia e não ter onde aplicá-la por falta de projetos. E nós temos novos projetos.”Rodando com eucalipto – Moura reforçou que o eucalipto pode ser tão bom (ou até superior) à cana-de-açúcar para a produção de etanol, desde que se aproveite de forma eficiente os seus resíduos. As cascas do eucalipto permanecem no solo das plantações depois da extração dos troncos, destinados à indústria de papel e celulose – boa parte desses resíduos, ao ser fermentada ao longo dos anos, libera gases de efeito estufa. Com o reaproveitamento das cascas, as empresas não só garantirão um menor impacto ambiental, como trabalharão com uma fonte de energia poderosa. Segundo estudos, o eucalipto chega a gerar, em um ano, de 23 a 25 toneladas de biomassa por hectare, um número muito superior à própria cana-de-açúcar, que produz, no mesmo período, algo em torno de 10,6 t/ha de bagaço. Além do mais, o eucalipto possui, em relação ao bagaço de cana, quase o dobro de açúcares fermentáveis, como glicose, galactose e frutose, o que aumenta o potencial do eucalipto. Com tantos benefícios, era de se esperar que o Brasil, que até 2015 deve contar com pelo menos 4,3 milhões de hectares em área plantada de eucalipto (não só do setor de celulose), investisse em grandes fábricas para a produção de etanol obtido da celulose da madeira.

O investimento existe – e envolve bilhões de dólares –, mas até agora é totalmente voltado para a produção da celulose de fibra curta e não para geração de biocombustíveis. Entre 2012 e 2015, devem ser construídas novas fábricas de celulose, todas com capacidade de produção acima de 1,5 milhão de t/ano. Apenas no segmento de celulose branqueada de eucalipto existem quatro projetos confirmados: dois da Suzano Papel e Celulose, um da Fibria e outro da Eldorado do Brasil. Tudo para atender à demanda mundial que deverá crescer, segundo dados da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa), cerca de 1,5% ao ano até 2005, chegando a 516 milhões de toneladas. O Brasil, porém, está pronto para construir, praticamente, uma fábrica por ano até 2015? Esse modelo é sustentável? Essas questões foram amplamente debatidas durante as palestras do 43º Congresso da ABTCP. Há um ponto em que todos concordam: para continuar sendo uma potência no mercado de celulose e papel, não basta apenas construir fábricas e multiplicar a capacidade produtiva, é preciso aumentar ainda mais os investimentos em energia limpa e em processos que garantam “fazer mais com menos”, o lema da sustentabilidade. Não é mais um modismo e sim uma questão de sobrevivência.

Química e Derivados, Ralf Ahlemeyer, Evonik, peróxido de hidrogênio acaba reagindo com o H2S
Ahlemeyer: “É preciso investir em tecnologia, tecnologia e tecnologia

Tecnologia e sustentabilidade – “Investir em tecnologia, tecnologia e tecnologia”, recomendou Ralf Ahlemeyer, ao ser perguntado pela reportagem de QD sobre qual seria o caminho possível para que o setor de papel e celulose consiga crescer em ritmo chinês sem se tornar um dos vilões da questão ambiental. Ele é diretor de negócios da unidade de químicos industriais da Evonik, grupo alemão líder global em especialidades químicas e especialista na geração de energia obtida de fontes renováveis. Um dos destaques no estande da empresa durante o 43º Congresso da ABTCP foi o Hyprox, marca comercial do peróxido de hidrogênio, o versátil agente branqueador da celulose. Aplicado para branqueamento de polpas químicas, mecânicas e recicladas, o Hyprox gera uma série de benefícios à indústria, entre eles a redução do emprego de outros branqueadores químicos, a diminuição da cor do efluente e de reversão da alvura e o aumento da capacidade das plantas produtivas. “Não é tão simples falar de tecnologia para o empresário de celulose e papel ou de qualquer outro setor. A gente coloca um monte de fórmulas químicas na parede, nem tudo é simples de entender, mas aquele que conseguir aplicar as fórmulas em sua indústria não terá do que se queixar”, afirmou.

Ao longo dos anos, o peróxido de hidrogênio se tornou um produto imprescindível para a indústria de celulose e papel. Além de ser usado em larga escala na área ambiental, no tratamento de efluentes industriais e gasosos, de água potável, de esgoto e de recuperação de áreas contaminadas, o uso de Hyprox passou a ter outras funções importantes, como na diminuição do odor na indústria de celulose. O odor provém de compostos gasosos de enxofre reduzidos, que na linguagem técnica são denominados TRS (Total Reduced Sulfur). “Quando você passa por uma indústria de celulose é comum sentir um cheiro desagradável. Algumas pessoas brincam, dizendo que aquilo é ‘cheiro de dinheiro’, o que faz um certo sentido”, brincou Ahlemeyer, para depois falar sério. “Algumas empresas têm problema com a emissão do odor, tanto na atmosfera como no efluente. O peróxido de hidrogênio acaba reagindo com o H2S, minimizando o odor”, explicou.

Como uma das líderes mundiais na produção de peróxido de hidrogênio, com fábricas em dez países, capazes de produzir cerca de 600 mil t/ano, a Evonik investe milhões de dólares em pesquisas em busca de novas soluções. Entre as novidades da empresa no campo das pesquisas está a aplicação de peróxido de hidrogênio catalisado, que tem como função melhorar o desempenho dos químicos usados no branqueamento, resultando em um ganho de processo. “A busca dos produtores de celulose para melhorar o desempenho dos insumos químicos usados no branqueamento nos levou a desenvolver agentes catalisados. O desafio foi desenvolver uma tecnologia de recuperação do metal (catalisador), combinando a aplicação de peróxido de hidrogênio catalisado com outros estágios de branqueamento, atingindo excelência no resultado”, afirmou César Leporini, chefe de aplicação técnica da Evonik, no texto de apresentação da empresa.

Não há país ou empresa no mundo que não se preocupe com a questão da água. A África do Sul, por exemplo, está usando cerca de 98% de sua água disponível e nós próximos anos terá um déficit hídrico. O Brasil, como se sabe, é rico em água, mas pode cair na armadilha e deixar de investir em processos que não só reduzam o uso de matérias-primas, mas, principalmente, o consumo de água. Na indústria de celulose e papel, que consome muita água em seu processo de produção, o desafio é enorme. Não por acaso, o estande da Nalco, especialista global em tratamento de águas, foi visto com grande interesse pelos mais de 15 mil visitantes que compareceram ao 43º Congresso de Celulose e Papel organizado pela ABTCP. “Somos uma empresa internacional (são mais de 11 mil funcionários trabalhando em cerca de 130 países) e temos a vantagem de trazer as melhores tecnologias para dentro do Brasil”, afirmou César Mendes, diretor da Nalco. “Temos um compromisso firmado com a questão da sustentabilidade e nos últimos anos desenvolvemos programas de tratamento de água que contribuíram para a otimização dos processos, sobretudo em relação ao uso de caldeiras.”

Química e Derivados, César Mendes, Nalco, compromisso firmado com a sustentabilidade
Mendes: Nalco ainda insiste na venda do 3D Trasar para resfriamento

Mendes se refere ao 3D Trasar, um novo programa de gerenciamento de situações críticas em sistemas de resfriamento, lançado pela matriz, nos Estados Unidos. O programa consumiu US$ 10 milhões de investimentos e dez anos de pesquisas no centro P&D da Nalco, em Naperville, Illinois. O 3D Trasar é um método integrado para o tratamento de água, que tem como objetivo propor soluções otimizadas, combinando processos químicos desenvolvidos pela Nalco com tecnologia de ponta. O 3D Trasar permite, por exemplo, aos clientes monitorarem, em tempo integral, a obtenção de respostas rápidas a adversidades em sistemas de resfriamento de água e de caldeiras, reduzindo desperdícios e, portanto, o custo final do processo. “Já instalamos mais de 300 equipamentos 3D Trasar em várias fábricas pelo Brasil”, afirmou Mendes. Entre elas todas as grandes empresas do setor de celulose.

Durante o Congresso, a Nalco também apresentou outras tecnologias. É o caso do Filler TEK, que permite a produção de papel destinado à impressão gráfica menos propenso ao arrepelamento e à geração de pó, com maior resistência e desempenho da operação. Os benefícios são obtidos por meio do aumento do teor de cinza alcançado pela indústria de celulose e papel até o momento, sem perda de qualidade O custo/benefício é considerável, assim como outra tecnologia da Nalco, a Pareto, que desde a sua introdução, em 2006, gerou, segundo a empresa, uma economia de mais de 12 bilhões de litros de água fresca e mais de 340 bilhões de kcal de energia. A tecnologia Pareto é um sistema de injeção química que otimiza a mistura de químicos no decorrer do processo industrial de produção de papel (sistemas de retenção de drenagem, DAF, antiespumantes de prensas de lodo e outras), possibilitando que aditivos químicos sejam diluídos com água do processo em vez de água fresca.

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