IYC 2011 – Celebração da química une e mobiliza setor

Depois de comemorar os centenários do Prêmio Nobel de Marie Curie e da criação dos encontros Solvay de Físico-Química, estes originaram a atual União Internacional de Química Pura e Aplicada (Iupac), os químicos querem esticar 2011. E farão isso sem mutilar o calendário.

Os resultados obtidos com as ações relativas ao Ano Internacional da Química (AIQ), instituído pela ONU/Unesco, foram tão positivos que os envolvidos pretendem manter ativas várias iniciativas e, por meio delas, sustentar a boa imagem da ciência na sociedade.

“Sem dúvida, o maior feito do AIQ no Brasil foi ter conseguido aproximar e mobilizar todos os setores ligados à Química, do ensino e pesquisa à indústria, incluindo órgãos de classe e do governo”, afirmou a química e professora do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IQ-UFRJ) Cláudia Moraes de Rezende, também diretora da Sociedade Brasileira de Química (SBQ).

“Agora queremos manter e aprofundar esses relacionamentos.” Coordenadora do AIQ no Brasil, ela foi qualificada como “dínamo” por alguns de seus interlocutores pelo seu grande envolvimento e atividade durante todo o ano.

“A professora Cláudia nos procurou ainda na Basf, em nome da SBQ, para obter patrocínio para as atividades do AIQ e eu levei a ideia para a Abiquim, os associados aprovaram o investimento e aderiram às ações propostas”, comentou Fernando Figueiredo, ex-vice-presidente da Basf na América Latina e atual presidente executivo da Abiquim.

Figueiredo comentou ter havido uma reunião na sede do Sindicato da Indústria de Produtos Químicos e Petroquímicos do Estado de São Paulo (Sinproquim), no início do ano, com a participação de universidades, indústrias e órgãos oficiais, a exemplo do Conselho Regional da Química (CRQ-IV), para definir uma plataforma comum para todas as iniciativas do AIQ. “O planejamento geral não funcionou como uma camisa de força, cada empresa ou entidade pôde escolher a ação que mais lhe conviesse, mas a apresentação dessas atividades teve uma plataforma única, facilitando a identificação com todo o projeto, de forma harmônica”, explicou.

Dessa maneira, além das ações assumidas pela entidade empresarial do setor, cada indústria química pôde desenvolver suas próprias iniciativas, que incluíram visitas às fábricas. “Foram poucas essas visitas, porque uma indústria química em operação sempre constitui um risco, as instalações precisam ser preparadas para receber visitantes, especialmente crianças”, salientou Figueiredo. Em algumas empresas, a presença de crianças nas áreas de produção é terminantemente proibida. “Um ponto chave do setor químico é monitorar e gerir esses riscos”, considerou.

Química e Derivados, Laboratório, Cristália

A Abiquim, por sua vez, destinou R$ 2,2 milhões para projetos no âmbito do AIQ. “Apoiamos prioritariamente a área de comunicação por meio de audiovisuais, uso de mídias sociais (Facebook, Twitter, Orkut e blog) e na divulgação geral nos meios de comunicação”, explicou. O foco dos trabalhos, sob a coordenação da equipe brasileira do AIQ, foi direcionado para divulgar a ciência entre os jovens. Com resultado, temas de interesse químico apareceram 844 vezes em 23 estados, nos principais veículos de comunicação de massa. Nas mídias sociais, os resultados também foram animadores: 725 mil visualizações no Facebook (58% de pessoas entre 13 e 24 anos), 938 seguidores no Twitter, e 69 visitas por dia no blog (39 mil visualizações).

Figueiredo ressalta que o enorme número de ações desenvolvidas por todos os participantes colaborou para chamar a atenção da sociedade para a ciência. Só na Rede Globo (emissora líder de TV aberta), foram 14 inserções em programas durante o ano, a maior parte deles nos noticiários. “O experimento com a água do planeta também chamou muito a atenção do público em geral”, avaliou. Figueiredo acha difícil mensurar objetivamente o sucesso do AIQ, mas os indicadores citados servem como evidências animadoras.

“Nosso desafio atual é manter e avançar esses trabalhos em 2012”, afirmou. Além de preservar e aprofundar o relacionamento com a academia, entidades de classe e órgãos oficiais, a Abiquim pretende manter ativa a estrutura das redes sociais. “Eu recomendaria a criação de um conselho de notáveis, de todas as áreas, para discutir a Química com a sociedade, em caráter permanente”, comentou. Ele aponta um erro na condução do AIQ: “não chamamos para o grupo os sindicatos dos trabalhadores, apesar de mantermos excelentes diálogos com eles”.

Educação beneficiada – A coordenadora do AIQ no Brasil considera que as escolas dos cursos fundamental e médio foram o segmento que mais aproveitou as iniciativas realizadas. “Era o segmento mais distante das entidades do setor, que geralmente olham mais para os estudantes universitários e para os profissionais”, considerou. Essa distância se traduz no baixo conhecimento da sociedade sobre os temas ligados à Química.

“Foi exatamente isso que motivou o AIQ. Montamos exposições, lançamos livros escolares, tudo com grande abertura para a sociedade, sempre com linguagem acessível para mostrar onde está a Química, usando muito bem a internet”, explicou Cláudia de Rezende.
Os professores do fundamental e do ensino médio também foram destinatários prioritários das ações. O projeto de medição do pH do planeta foi definido pela organização mundial, mas teve ampla aceitação no Brasil. “Distribuímos mais de 35 mil kits para essas análises em todo o país e os resultados ainda estão chegando. Foi o maior experimento científico executado no Brasil e no mundo”, ressaltou.

O site internacional do AIQ informa que mais de setenta países aderiram ao projeto do pH do planeta. A ideia é determinar mediante testes simples, usando indicadores de cor, a acidez ou a alcalinidade da água de rios, lagos, mares e outras fontes. Os dados serão tabulados mundialmente. No Brasil, o Instituto de Química da Unicamp adaptou o kit às condições locais e o produziu em escala. O CRQ-IV, a Associquim e o Sindicato dos Químicos de São Paulo (Sinquisp) apoiaram a distribuição dos kits.

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Augustinis: unido, setor precisa desenvolver uma agenda comum

“Além da distribuição, também promovemos palestras para incentivar e orientar os professores a participar do projeto”, informou Manlio de Augustinis, presidente do CRQ-IV. Os palestrantes, nesse caso, foram professores universitários, conselheiros e fiscais do CRQ, bem como alguns profissionais do setor.

O CRQ-IV destinou aproximadamente R$ 2 milhões para ações ligadas ao AIQ, grande parte delas para custear a divulgação em televisão entre junho e dezembro. “Até outubro, já tínhamos apresentado 1.807 palestras sobre Química em 369 escolas de nível fundamental e médio do Estado de São Paulo, atingindo mais de 127 mil alunos”, comemorou Augustinis, salientando que a meta inicial era de 1,5 mil apresentações.

Segundo o presidente do CRQ-IV, como houve mais de quatro mil solicitações dessas palestras, a entidade pretende manter essa iniciativa nos próximos anos. Ele informou que a divulgação das palestras por parte da Secretaria Estadual de Educação contribuiu muito para a aceitação do projeto.

O conteúdo e o modelo das apresentações foram definidos pelo professor Guilherme Marson, do IQ-USP, e o material de apoio foi custeado pelo CRQ-IV. O mesmo professor também organizou e coordenou as atividades sobre Química realizadas durante todo o ano na Estação Ciência, no bairro da Lapa, em São Paulo, com apoio financeiro do CNPq. Abrangendo a exposição “Química para um mundo melhor” e experimentos práticos interativos e lúdicos, essa atividade terá caráter itinerante em 2012.

“O AIQ foi um sucesso, conseguiu unir todos os segmentos ligados à Química, precisamos manter essa conquista”, salientou Augustinis. Ele recomenda elaborar uma agenda com objetivos comuns para consolidar o trabalho conjunto no setor. Um dos pontos mais importantes a merecer a atenção de todos é a educação das crianças e jovens. “O CRQ propôs a montagem de oficinas para formar ou atualizar professores de Química de nível fundamental e médio, mas precisamos assegurar o apoio de entidades públicas e das universidades”, comentou.

Entre os países que participaram do AIQ, o Brasil não fez papel feio. O número de ações registradas e efetivamente desenvolvidas no país o colocou entre os três mais animados do planeta. “Fomos também muito procurados por entidades congêneres de outros países para o estabelecimento de intercâmbios e convênios”, comentou a professora e diretora da SBQ. Isso se reflete, como avaliou, no fato de o país ter alcançado um nível de desenvolvimento econômico e científico mais significativo, especialmente nos campos de fitofármacos e biocombustíveis. “Somos também uma economia em franco crescimento”, comentou. Isso também explica a grande presença de laureados com o Prêmio Nobel em vários congressos e seminários realizados no país.

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Cláudia: ensino básico deve mostrar a beleza da ciência para os jovens

No dia 16 de dezembro será inaugurada uma grande exposição interativa na Casa da Ciência da UFRJ, intitulada: Química dentro de casa. Para 2012, estão previstos os lançamentos de dois livros didáticos no escopo do AIQ, sobre energia nuclear e experimentos (para graduação e cursos técnicos). “Temos mais um livro, sobre perfumes, que também poderá ser lançado no ano que vem”, salientou Cláudia de Rezende. O portal www.quimica2011.org.br, coordenado pela professora, terá continuidade, seguindo o mesmo modelo, bem como os sites voltados para o público jovem (Quid+) e aprendizagem (Química Nova interativa, da SBQ), e o blog da AIQ. “Daqui a alguns anos poderemos avaliar com certeza se conseguimos influir positivamente no grau de interesse dos jovens pela ciência”, afirmou. “Posso dizer que deu muito trabalho, mas foi uma experiência gratificante.”

Avanços no ensino– A metodologia de ensino da Química nas escolas foi tema de amplos debates durante o AIQ, cristalizando um diagnóstico bem claro. “O modelo de educação não mostra para os jovens a beleza da ciência”, salientou a professora Claúdia de Rezende. “A Química é uma ciência complexa, não dá para atrair as crianças para coisas que elas não conseguem enxergar, precisamos trazer o ensino para a realidade delas”, defendeu.

Banheiros e cozinhas são imensos laboratórios, cheios de produtos químicos que deveriam ser explorados para transmitir ideias e conceitos básicos da ciência, de forma muito mais atraente. “A Química está em tudo, vamos olhar para o que temos mais à mão”, recomendou. Segundo informou, já existem muitos materiais didáticos disponíveis, até mesmo no portal do AIQ, e os computadores ajudam muito no processo de aprendizagem.

Com certeza, uma abordagem mais palatável para alunos do ensino médio e fundamental poderá incrementar a procura pelos cursos superiores de Química. “Essa procura já subiu como resultado do AIQ”, afirma Augustinis, do CRQ-IV. Uma rápida observação das estatísticas do exame vestibular organizado pela Fuvest (Fundação Universitária para o Vestibular), o maior desses certames no país, capaz de abrir as portas da Universidade de São Paulo para os aprovados, dá razão ao presidente do CRQ. O exame deste ano para o curso pleno de Química (bacharelado/licenciatura) da USP na capital teve 664 candidatos para as suas 60 vagas, com índice de 11,07 candidatos/vaga. No ano passado, o mesmo número de vagas foi disputado por 616 inscritos (índice de 10,27).

Química e Derivados, Dow, Centro de Desenvolvimento, IYC 2011O bacharelado em Química da USP em Ribeirão Preto também apontou aumento de demanda: neste ano, suas 60 vagas foram disputadas por 402 candidatos (relação de 6,70), enquanto no ano anterior os inscritos eram 365 (relação de 6,08). O bacharelado de São Carlos acompanhou a tendência: 60 vagas para 379 inscritos (relação de 6,32), contra 370 no certame anterior (ou 6,17 candidatos/vaga).

No entanto, a demanda pelas vagas de licenciatura nas unidades de São Paulo e Ribeirão Preto caiu, em número de inscritos, de 130 para 122 (índices de 4,33 para 4,07 c/v) e de 139 para 123 (3,48 para 3,08 c/v), respectivamente. O vestibular da Unicamp registrou queda de 742 para 691 candidatos para suas 70 vagas do curso de Química de período integral (10,6 para 9,9 c/v).

Além disso, mesmo o curso mais disputado de Química da Fuvest, com sua relação de 11,07 candidatos/vaga ainda ficou muito longe do índice de 47,20 c/v registrado por publicidade e propaganda. Ou dos 51,18 c/v do curso de medicina (USP – São Paulo), ou ainda da engenharia civil de São Carlos, com 52,27 candidatos disputando cada uma das suas 60 vagas. Dada a relevância da Química para o desenvolvimento da ciência e tecnologia, é bom mesmo que os esforços do AIQ não terminem no dia 31 de dezembro.

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