Isolantes térmicos: Crise energética aumenta procura por revestimentos
Importante para conservar energia, a isolação térmica, com revestimentos rígidos e com a fibra cerâmica, ganha fôlego novo com a crise do apagão

O mercado de isolantes térmicos começa a se beneficiar de um de seus principais méritos: a conservação de energia proporcionada a equipamentos e sistemas industriais. O motivo para a reviravolta não poderia ser outro senão a crise do apagão de 2001. Depois de passar a dar mais valor à cara e escassa energia, a indústria em geral se atentou para o fato de que investir em sistemas com a propriedade de aumentar o aproveitamento energético é uma saída das mais inteligentes.
Essa mentalidade renovada dos clientes, na opinião dos competidores do setor, está em processo inicial de maturação. Em 2001, ela foi suficiente apenas para recuperar as vendas no segundo semestre e manter o desempenho no mesmo patamar do ano anterior.
Compartilha dessa análise o gerente nacional de vendas da Calorisol, Jorge Veiga, tradicional empresa especializada em todos os tipos de isolamento térmico. “Apesar da sucessão de crises, não foi um ano recessivo”, afirmou Veiga.
Para o gerente, a tendência de crescimento já começa a se tornar perceptível em 2002. “Devemos aumentar em pelo menos 10% nossas vendas”, prevê. Na indústria em geral, onde a maior parte do consumo de isolamento visa atender necessidades de calor médio por volta de 300ºC a 400ºC, Veiga acredita ainda que a racionalização dos processos tem também papel importante na maior procura por isolamentos térmicos.

Nesses clientes de maior volume, com necessidade de calor até 400ºC, o gerente percebe uma outra tendência, de cunho tecnológico. Em razão de problemas de saúde ocupacional de isolantes fibrosos, principalmente as lãs de rocha e de vidro, Veiga afirma que os isolantes rígidos tendem a ganhar mais espaço. Nesse caso, destaca-se o silicato de cálcio, aplicado em calhas para tubulações e capas para equipamentos. Segundo ele, o Brasil deve seguir o exemplo europeu, onde a lã de vidro é muito restringida, e dos Estados Unidos, onde a perseguição maior atinge a lã de rocha.
Essa substituição visa evitar sobretudo os problemas pneumológicos causados por essas fibras, visto que os equipamentos revestidos com elas, por não estarem sujeitos a temperaturas mais elevadas, não ficam muito confinados e podem contaminar os operadores ao longo do uso. O silicato de cálcio, lembra Jorge Veiga, pode substituir essas fibras em aplicações até 1.040ºC.
Já em temperaturas consideradas altíssimas, de até 1.260ºC ou em alguns casos até 1.600ºC, uma outra fibra, a cerâmica, encontra mercado crescente, por ser altamente isolante, e não tem sido vista com preocupação no quesito saúde-ocupacional. Isso porque esses revestimentos ficam bem distantes de qualquer contato com operadores, em estruturas internas de fornos, caldeiras e outros equipamentos ou em tubulações sob temperatura muito quente.
Fibras cerâmicas – Por causa dessas vantagens intrínsecas, o mercado de fibras cerâmicas tem-se destacado como promissor dentro do setor de isolação térmica. Disponível em cada vez mais tipos diferentes de formulações e formatos, esse revestimento altamente refratário ao calor conquista mercados antes limitados a outros tipos de produtos, como os tijolos refratários.
Cerca de três vezes mais isolante (resiste a até 1.600ºC), até dez vezes mais leve e com a propriedade de armazenar muito menos calor (fazendo o sistema consumir menos energia) do que os tijolos, a fibra tem evoluído bastante desde o seu desenvolvimento em 1948, pelo cientista Charles MacMüller, da norte-americana Carborundum. Inicialmente voltada para atender as exigências da indústria aeroespacial, para garantir a resistência térmica dos foguetes na entrada da atmosfera, hoje consegue atender boa parte das necessidades de isolamento dos fabricantes de equipamentos.

A maior abrangência de aplicação se deve a várias novas formas de aplicação da fibra cerâmica, que permitem substituir os tijolos em estruturas de grandes equipamentos. É comum o fornecimento de módulos e painéis construídos com base de fibras cerâmicas cimentadas, reforçadas com várias outras cargas e também fibras que aumentam sua resistência mecânica.
Um bom exemplo foi um serviço realizado pela Unifrax, ex-Carborundum, para a Copene, central petroquímica baiana, em fevereiro de 1998. Na reforma dos 22 fornos de pirólise da central, todo o revestimento interno da zona de convecção, de 340 metros quadrados, foi feita com peças pré-moldadas a vácuo com fibra cerâmica e com coating de mineral mulita, responsável pelo aumento da resistência abrasiva.
Além de ser mais leve e fácil de aplicar do que os tijolos refratários antes utilizados, a resistência térmica e abrasiva dos fornos tornou-se mais que suficiente para atender a necessidade de 1.000 a 1.100ºC dos fornos de pirólise.
“Um aspecto muito positivo na troca foi a facilidade da obra, pois o encaixe dos painéis, em perfis isolantes especialmente projetados, não requereu a remoção de tubulações ou banques de tubos dos fornos”, afirmou o gerente de vendas e marketing da Unifrax, Luiz Carlos Simão.
Mudança institucional – As mudanças no mercado de fibras cerâmicas também passam pelo aspecto institucional. A tradicional Carborundum, responsável pelo surgimento da fibra cerâmica e por contínuas pesquisas que expandiram seu uso na indústria, foi totalmente reformulada após seguidas negociações de compra e venda. A primeira fase desse processo foi a venda total do grupo, incluindo a área de abrasivos, refratários e fibras, para a francesa Saint Gobain, em 1996. Ocorre que nesse negócio apenas uma unidade americana do grupo, produtora da linha de fibras cerâmicas FiberFrax, não foi comprada pelos franceses. Essa unidade se manteve independente e, em outubro de 2000, ganhou fôlego com uma aquisição inusitada: as sete outras fábricas de fibra cerâmica da antiga Carborundum até então nas mãos da Saint Gobain.

Com essa nova estrutura, a empresa passou a se chamar Unifrax e voltou a ganhar peso mundial, concorrendo em pé de igualdade com a outra grande competidora, a Morganite. No Brasil, aliás, esse cenário mundial se repete, com as duas líderes detendo o grosso do mercado estimado em cerca de R$ 20 milhões, com consumo por volta de 6.500 t/ano de fibras. Apenas um pequeno percentual, em torno de 3%, provém de importações de produtores chineses e indianos.
A fábrica da Unifrax no Brasil continua em Vinhedo-SP, vizinha ao quartel general da ex-controladora, a Saint Gobain. É nessa unidade que as fibras são produzidas a partir da fundição a 2.400ºC de grãos de alumina e de quartzo, das quais geram-se filamentos que recebem sopro de ar para a fibrilização final. Normalmente, faz parte da formulação a zirconita, para aumentar a refratividade da fibra. Para a comercialização, além de dispor a fibra in natura para jateamento, a empresa prepara a fibra em mantas, sistemas modulares e em painéis e pré-moldados.
O caso dos sistemas e painéis pré-moldados a vácuo, considerado um dos últimos estágios na evolução das aplicações da fibra, é especial para a filial brasileira da Unifrax. Isso porque, ainda na época da Carborundum, os técnicos nacionais desenvolveram o sistema pré-moldado revestido com coating do mineral mulita para reforçar a resistência mecânica e também térmica das fibras. E o Brasil detém a patente mundial do processo, em nome do gerente Luiz Carlos Simão, da Unifrax.
Lançamentos – Há mais de 40 anos no Brasil, a outra grande competidora no mercado de fibras cerâmicas, a Morganite, também passou recentemente por uma mudança interna. Desde 2002, essa área passou a se denominar Thermal Ceramics. Controlada pelo grupo inglês Morgan, a mudança acompanha uma reformulação mundial, que visa unir numa só divisão os negócios de isolantes térmicos, ainda formado pela área de escovas de carvão, cadinhos e de refratários e fibras de carvão. Ainda faz parte da Morganite as divisões carbono e de cerâmica (tijolos isolantes).

Com fábrica no Rio de Janeiro com capacidade instalada para 4.500 t/ano de fibras, a Morganite também ajuda no desenvolvimento desse mercado, criando novas aplicações. Não por menos, a empresa divulga uma série de lançamentos. Dentre eles, o diretor de operações da Morganite, Antonio Carlos Resende, destaca a linha Kaowool de papéis adesivados de fibra cerâmica.
“Devido a sua propriedade colante, substitui-se a fixação mecânica no revestimento de peças e superfícies metálicas ou cerâmicas”, ressalta Resende. Resistentes a até 1.260ºC, esses papéis são disponíveis em espessuras de 0,8 mm até 6,4 mm.
Resende também dá importância ao lançamento do isolante de sílica microporosa BTU-Block. Trata-se de pós microscópicos com alta resistência térmica e utilizados para encher invólucros de tecidos ou como reforço de tijolos refratários. Segundo o diretor, a sílica pode ser considerada de alto desempenho e substituir a própria fibra cerâmica, por ter o dobro da resistência térmica, em panelas de recipiente de metais líquidos, carros-torpedo de siderurgia e em aplicações aeronáuticas, no isolamento térmico do reverso de aviões e nas caixas-pretas.
Para isolamento térmico de alta e baixa temperatura de tubulações, o centro de pesquisas da Morganite criou o sistema Kaowool Pipe. O isolamento aí é por meio da junção do ar com a fibra cerâmica. São filmes de alumínio intercalados com tiras cerâmicas em cujos espaços vazios o ar se concentra. “O ar é um isolante natural”, lembra Resende. Com alta resistência ao impacto e a intempéries, permite a utilização em temperaturas de -210ºC a 1.260ºC. Foi utilizado no sistema de resfriamento do edifício-sede da Petrobrás no Rio de Janeiro. Todos os 18 mil metros lineares de tubulações, antes protegidos com poliuretano rígido, foram substituídos.