Fenasan – Baixo investimento em saneamento aumenta o temor da falta de água
Um velho tema – o baixo índice de tratamento de água e esgoto no país – preocupa os técnicos do setor, em meio à ameaça da crise hídrica, que já adquire contornos planetários. Esta temática rondou as mentes dos participantes do Encontro Técnico AESabesp, 27º Congresso Nacional de Saneamento e Meio Ambiente, realizado entre os dias 16 e 18 de agosto no pavilhão Vermelho do Expo Center Norte, em São Paulo.
Embora apareça entre as dez maiores economias do mundo, o Brasil ocupa a 112ª posição em um conjunto de 200 países no quesito saneamento básico, aponta estudo divulgado pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável, realçando “o longo caminho que deve ser percorrido em busca do melhor acesso da população à água e ao esgoto tratado”, analisa Igor Freitas, da Bauminas Química.
O Instituto Trata Brasil sinaliza que 82,5% da população é atendida com água tratada. Por outro lado, há pelo menos 35 milhões de brasileiros que não têm acesso a esse serviço básico. A coleta de esgoto beneficia 48,6%, ou seja, há mais de 100 milhões de pessoas à margem desse serviço público.

O congresso contou com 1.710 integrantes e transcorreu, paralelamente, à Fenasan – Feira Nacional de Saneamento e Meio Ambiente, que exibiu as mais recentes novidades em produtos e soluções tecnológicas. Juntos, formam o maior evento técnico-mercadológico do ramo na América Latina, uma promoção da Associação dos Engenheiros da Sabesp (AESabesp).
Na palestra magna, o secretário nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades, Alceu Segamarchi Jr., mostrou o descompasso entre o volume de recursos liberados pelo Governo Federal para melhorar o saneamento e os valores compromissados: entre 2003 e 2014, houve um desembolso de R$ 82,18 bilhões frente a compromissos da ordem de R$ 140,23 bilhões.
Embora o Plano Nacional de Saneamento Básico, concluído em 2013, contemple, nos centros urbanos, a universalização do abastecimento de água até 2023 e 93% do tratamento de esgoto sanitário até 2033, envolvendo aportes totais de R$ 508 bilhões (em valores de 2013), a realidade é que a evolução não segue o ritmo planejado. Para ser cumprido, o Plano exige, na média, gastos de R$ 15 bilhões/ano: “O Brasil não está gastando isso”, afirmou Segamarchi.

Para o presidente da Sabesp, Jerson Kelman, há “dificuldades concretas” para a implementação do Plano nos municípios. E disparou: “A Sabesp está empenhada em fazer contratos que devem registrar o que se pode e não o que se pretende fazer”. Ele também falou que há uma ênfase no país na construção de estações de tratamento de esgoto, mas não se confere a mesma atenção na sua operação e manutenção.
Ciente de que “estamos longe da universalização do saneamento” e que muitos investimentos devem ser orientados nesse sentido e na segurança hídrica, Kelman aludiu à possibilidade da elevação da tarifa média para custear os gastos necessários. No caso específico da Sabesp, uma das maiores empresas do mundo em número de clientes, admitiu que a “estrutura tarifária não contempla uma razoável distribuição de custos”. Por tudo isso, se houver uma mudança nesse modelo, ele opina que “deveria ocorrer ao longo de vários anos”.

Na palestra “Saneamento, segurança da água e as consequências para a saúde”, Jamyle Grigoletto, analista do Ministério da Saúde, lembrou que o saneamento é um dos determinantes sociais da saúde pública, deixando claro que os investimentos auxiliam na redução de doenças de transmissão hídrica e por vetores (como o Aedes aegypti).
Ao citar que, no Brasil, 6% do total da população é abastecido por água sem nenhum tipo de tratamento, Jamyle exclamou. “É muita gente!”. Não é por acaso que o Ministério da Saúde contabiliza 3.508 óbitos este ano causados por diarreia aguda. As maiores incidências estão nas regiões Norte e Nordeste. Além disso, há 206 municípios, distribuídos por quase todos os Estados, em situação de risco de surtos de dengue, chikungunya e zika. E já foram computados 8.890 casos de microcefalia em 1.510 dos 5.570 municípios (4,4% de óbito fetal).
O caminho para melhorar esse cenário passa, na opinião de Jamyle, pelos planos municipais de saneamento básico. Mas, no momento, “só 20% a 30% dos municípios” atendem os requisitos. “O desafio é integrar as políticas públicas de saúde, saneamento e recursos hídricos, entre outras”, arrematou.