Entrevista: Gigante químico está integrado na região

A tarefa de Osni de Lima consiste em completar, em âmbito regional, a fusão de dois gigantes globais, Solvay e Rhodia.

Embora o grupo empresarial belga tenha adquirido em setembro de 2011 a companhia química francesa, sucessora da Rhône-Poulenc, o nome Rhodia foi mantido para representar o conglomerado no Brasil, onde vem sendo usado há 94 anos.

A presidência mundial da companhia foi exercida inicialmente por Christian Jourqin, que se aposentou e deixou o lugar para o executivo Jean-Pierre Clamadieu, oriundo da parte francesa.

Osni de Lima ingressou na Rhodia em 2001 para dirigir a área de recursos humanos, tendo acumulado vasta experiência anterior em empresas como Alcan, DuPont, Merck (farmacêutica) e Tess (telecomunicações). Assumiu a presidência da Rhodia América Latina em abril de 2012, com a saída de Marcos De Marchi para a Elekeiroz, cargo reformulado pela nova Solvay, que colocou sob seu comando as operações na América do Sul e no México.

Porém, a estrutura do grupo químico compreende 11 unidades de negócios globais (GBU), agrupadas em cinco áreas: consumer chemicals, advanced materials, performance chemicals, functional polymers, e corporate business and services. Trata-se de uma estrutura matricial complexa, na qual as GBUs respondem diretamente aos seus líderes mundiais, embora a presidência regional tenha o encargo de coordenar as suas atividades.

O presidente do grupo Solvay na América do Sul recebeu Química e Derivados na sua sede regional, no Centro Empresarial de São Paulo, em instalações completamente reformuladas para abrigar todos os profissionais da empresa consolidada na região.

QD – Como vão os trabalhos de integração da Solvay com a Rhodia? As diferenças culturais entre as antigas companhias atrapalham?

Química e Derivados, Lima: semelhanças eram maiores que diferenças
Lima: semelhanças eram maiores que diferenças

Osni de Lima – Existiam diferenças culturais, mas posso garantir que as semelhanças eram ainda maiores. Solvay e Rhodia eram, e ainda são, companhias de grande porte, com atuação mundial e foco na inovação e na eficiência operacional. Isso ajuda muito. Além disso, praticamente não havia negócios idênticos nas duas companhias, portanto, houve uma complementação de portfólio, sem a necessidade de eliminar duplicidades. Isso só aconteceu na parte administrativa, mesmo assim foi relativamente fácil consolidar a equipe.

QD – O fato curioso é que, pelo menos no Brasil, a parte comprada acabou sendo a dominante. E mesmo em termos globais, o fato de o presidente executivo (CEO) ter vindo da Rhodia também é, de certa forma, curioso.
Lima – Dentro das expectativas dos acionistas do grupo Solvay, essa foi a melhor solução. Aqui, no Brasil, estamos em um estágio muito avançado de consolidação, somos talvez a primeira região a colocar no mesmo espaço físico os escritórios das duas companhias. Parece fácil, mas não é. A instrução global era alugar e equipar um espaço totalmente novo, para que nenhum dos profissionais se sentisse em posição de desequilíbrio em relação aos outros. Ou seja, um campo neutro, nada que pudesse ser entendido como “parte dominante”. Aqui, dado o alto custo para alugar escritórios novos de alto padrão, optamos por reformar totalmente o andar que ocupávamos e ainda conseguir mais um espaço no prédio para acomodar a todos. Mudamos todos os aspectos visuais, cores, carpetes, mobiliário. Realmente, não há nada que lembre a antiga empresa.

QD – Falta alguma coisa para completar a fusão regional?
Lima – Na parte administrativa, os sistemas de tecnologia da informação ainda estão rodando separados. Isso é muito complicado, vai demorar mais um pouco. É normal. A área de polímeros especiais da Solvay era a única que tinha algum confronto com os negócios da Rhodia, embora a primeira se dedicasse mais aos fluorpolímeros, enquanto a outra se especializou nas poliamidas. Decidimos, então, agrupar todo esse pessoal na unidade de São Bernardo do Campo-SP, com o objetivo de promover sinergias.

QD – As companhias também tinham políticas diferentes em relação a planos de benefícios e de pensão para seus funcionários, em âmbito global. Isso já foi equacionado?
Lima – Esse assunto ainda é um desafio para a nova administração. De fato, as companhias tratavam esses temas de forma diferente e não há uma decisão de como lidar com isso. Por enquanto, nada mudou nesse aspecto.

QD – O grupo Solvay sempre foi muito conservador em relação à disciplina financeira e na política de investimentos. De alguma forma, isso afetará o Brasil, cujo ambiente de negócios não é dos mais favoráveis atualmente?
Lima – A atual direção mundial do grupo conhece bem o Brasil e sabe que esses cenários por aqui mudam muito rapidamente. O país ainda é visto com bons olhos, com um grande futuro pela frente.

QD – A operação brasileira ainda é relevante para o grupo?
Lima – É muito importante. O site de Paulínia-SP, por exemplo, hoje é o maior do grupo em todo o mundo. Até o ano passado era o segundo, mas como o site de Tavaux, na França, foi incluído na joint-venture com a Ineos para a atividade de policloreto de vinila (PVC), Paulínia assumiu a liderança em volume de produção. Veja que duas das 11 GBUs estão sediadas no Brasil: a de fibras e a Coatis (solventes e intermediários da cadeia do fenol). O país tem posição de destaque na produção química obtida de fontes renováveis, uma das grandes tendências para o futuro do setor.

QD – A cadeia de cloro-soda e PVC é muito relevante para a Solvay na América do Sul, mas esses negócios estão sendo alienados pelo grupo. Isso afeta os planos regionais?
Lima – De fato, o grupo Solvay declarou que os negócios de PVC não são considerados prioritários. Em maio, firmou com a Ineos um acordo para criar uma joint-venture paritária para lidar com os negócios de cloro, soda e vinílicos na Europa, com a possibilidade de venda para ela da sua participação em um prazo de quatro a seis anos. Mas esse acordo não inclui os ativos da linha de vinílicos na América do Sul, no Brasil e na Argentina, especificamente, que devem ser negociados, mas ainda não há nada concreto a respeito.

QD – Em compensação, é crescente a produção da chamada química verde por aqui.
Lima – É verdade, temos solventes produzidos com glicerina, a linha Augeo, além de derivados de etanol. Estamos avançando também nos álcoois de segunda geração, obtidos de biomassa vegetal. Celebramos uma parceria em agosto com a GranBio, da família Gradin, que vai iniciar a produção de etanol de bagaço de cana no ano que vem, em Alagoas. Nós pretendemos aproveitar os açúcares liberados pela digestão das fibras para produzir n-butanol, insumo de amplo uso na indústria química. Nós mesmos consumimos bastante.

QD – Esse entusiasmo é apoiado em bons resultados aqui no Brasil?
Lima – Infelizmente, não teremos um resultado brilhante em 2013 na região, embora alguns negócios estejam obtendo excelentes resultados. Os produtos da Novecare (tensoativos para várias aplicações), as sílicas, a fibra de acetato (Acetow) e os plásticos de engenharia são bons exemplos, mas as outras áreas sofrem muito. Em 94 anos de história da companhia no Brasil, tivemos apenas três momentos muito ruins: no Plano Collor (1990), na crise mundial de 2008/09, e agora, em 2013. E é o ano do 150º aniversário da Solvay.

QD – O que atrapalha os negócios no Brasil?
Lima – Podemos apontar dois problemas fundamentais: o custo da energia e as deficiências da infraestrutura, incluindo logística e tributação. Nossas matérias-primas, como a nafta e o gás natural, estão entre as mais caras do mundo, assim como a tarifa da energia elétrica, mesmo depois da redução imposta pelo governo federal. Enquanto isso, os Estados Unidos têm energia e gás baratos, a produção petroquímica deles está deslanchando e é altamente competitiva. A situação da Argentina e da Ásia também está difícil.

QD – A produção brasileira ainda é competitiva globalmente?
Lima – Atualmente, nossa competitividade está muito baixa, não só na indústria química. Veja nossos custos logísticos: transportar um produto de Paulínia para Xangai (China) custa US$ 10 por tonelada menos do que levar o mesmo produto para Camaçari-BA. E o governo adota soluções inadequadas para isso, na linha das barreiras alfandegárias seletivas. Isso não funciona, não dá para barrar tudo. Além disso, a tarifa maior beneficia um elo da cadeia, mas os demais ficam ainda menos competitivos. Há outros problemas, como o custo da folha de pagamento, que não cai, mesmo com todos os esforços empreendidos.

QD – Encontrar pessoal qualificado e retê-lo na indústria é difícil?
Lima – Sim, o setor não é mais tão atraente como foi no passado. Fizemos algumas adaptações para melhorar a retenção do pessoal. A Rhodia mantém um dos mais antigos, senão o pioneiro, programa de trainees na indústria química brasileira. De alguns anos para cá, percebemos que muitos jovens passavam por todas as etapas do programa, que dura dois anos, mas não queriam ser contratados. Para eles, o programa servia apenas para melhorar o currículo. Porém, os trainees que tinham feito estágio anterior na companhia apresentaram maior índice de permanência na companhia. Eles absorveram melhor os valores corporativos, realmente têm interesse em desenvolver carreiras por aqui. Por isso, estamos aproveitando mais os estagiários no programa de trainees. É bom salientar que cada geração tem suas características. É preciso entendê-las.

QD – Qual o papel do presidente regional em uma estrutura de negócios matricial, como a da Solvay, com unidades de negócios que reportam diretamente para seus líderes mundiais?
Lima – Embora as GBUs sejam independentes, valorizamos muito a transversalidade, buscamos uma integração entre elas para que as operações sejam as mais eficientes. Meu papel é coordenar a atuação das GBUs e os seus líderes locais, evitando seu isolamento. Há muitas sinergias que podem ser aproveitadas, especialmente quando há diálogo. Na companhia, os presidentes regionais também devem assumir uma diretoria operacional. No meu caso, mantive o comando sobre a área de recursos humanos, a minha especialidade.

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