Embalagens – Abre projeto crescimento tímido em 2004
Embalagens – Motivos para otimismo em relação à economia brasileira nesse início de ano existem. As vendas do comércio varejista diminuem o ritmo de queda, a produção industrial cresce, a utilização da capacidade instalada aumenta, mas apostar que 2004 será o ano da propalada recuperação da atividade econômica ainda não é seguro, conforme demonstrou o coordenador de análises econômicas da Fundação Getúlio Vargas Salomão Quadros, em palestra promovida pela Associação Brasileira de Embalagem (Abre).
Não que a recuperação seja improvável, pelo contrário. Mas a análise dos dados mostra que o ritmo do crescimento ainda será menor que o almejado pelos empresários mais otimistas.
Quadros iniciou suas explanações abordando o desempenho do setor de embalagens em 2003. O crescimento da taxa de desemprego e a queda do rendimento real e do consumo, no ano passado, impactaram a produção de bens não-duráveis, tipicamente produtos essenciais (como alimentos) com vendas fortemente atreladas às oscilações da massa salarial. E, como bem sabia a platéia presente, o freio na produção de bens não-duráveis também breca o consumo de embalagens a produção brasileira, entre janeiro e dezembro de 2003 encolheu 6,65%, principalmente devido à retração das embalagens de papel e papelão (-4,93%), plásticas (-8,52%) e metálicas (-13,30%), que representam algo como 90% desse universo. Vidro (crescimento de 3,97%) e madeira (12,26%) lograram bom desempenho, mas respondem por fatia menor que 10% do mercado de embalagens.

O número global, por si só, não é catastrófico. Desde 1990, o setor experimentou quedas muito mais drásticas, sucedidas, entretanto, por algumas recuperações vigorosas. A partir de meados de 1996, porém, as variações na produção de embalagens têm sido muito mais suaves, revelando menor capacidade de reação do setor. “Hoje existem mais tributos, os juros estão mais altos, e com o poder aquisitivo em queda ocorre uma certa fadiga econômica. Por isso, a possibilidade de um salto de recuperação do setor em 2004 é improvável. Será necessário um tempo maior para que se recuperem os níveis de produção de 2002”, disse Quadros.
A receita líquida das vendas de embalagens, numa aparente contradição, cresceram 16% em 2003, chegando a R$ 23,7 bilhões. Mas, segundo Quadros, o motivo do crescimento foram os repasses de preços – os preços da maior parte das matérias-primas para embalagens foram reajustados no ano passado – e não o crescimento relativo das vendas. Para o presidente da Abre Fabio Mestriner, outros dois fatos também explicam o aumento da receita. Um é o novo padrão de mercado que aponta para o uso de embalagens de menor volume e maior qualidade (ou seja, mais embalagens, e mais caras, são necessárias para o empacotamento das mesmas quantidades); o outro, o bom desempenho das exportações, alternativa para a queda de renda do consumidor doméstico.
Mesmo o aumento da produção industrial, a partir de setembro de 2003, não pode ser tomado como indicativo firme de recuperação. Segundo Quadros, já no fim do ano a indústria começou a andar de lado, mantendo o nível de produção. “A recuperação de setembro não pode ser extrapolada, não serve como indicação de tendência futura, pois foi muito reticente e localizada em alguns setores, devido principalmente à falta de perspectiva de aumento da renda”, observou.
Para 2004, Mestriner, da Abre, aposta no crescimento das exportações. O presidente da Associação anunciou a meta de exportar 20% da produção nacional de embalagens no ano. Em 2002, esse percentual foi de 7%; em 2003, subiu para 13%. A previsão seria baseada na boa competitividade das embalagens brasileiras – o País produz as matérias-primas e possui produtos de boa qualidade – e na percepção de que as exportações agrícolas devem manter o bom desempenho. Um fato novo, que também deve impulsionar as vendas ao exterior, segundo Mestriner, é a entrada de competidores nacionais em negócios do tipo global sourcing, em que empresas nacionais podem tornar-se fornecedoras das matrizes de multinacionais instaladas no País.
Salvos pela exportação — Os números decepcionantes da indústria brasileira de embalagens, em 2003, só não foram piores porque, segundo o presidente Fábio Mestriner, o setor já havia iniciado em 2002 processo de desenvolvimento de exportações. Até esse ano, a participação da Abre em feiras internacionais era marcada por visitantes interessados em exportar para o Brasil, instalarse ou em encontrar representantes locais. O perfil mudou a partir de 2003, com o início da demanda por embalagens brasileiras. A Abre detectou a mudança e verificou entre seus associados o crescimento das exportações.
De fato, as exportações brasileiras de embalagens praticamente dobraram em 2003, mas não por acaso, pois a Abre criara comitê de exportação com dois propósitos: inserir a embalagem na pauta de exportação do País (é importante que o Estado saiba que as embalagens nacionais podem competir internacionalmente) e estimular e ajudar associados a exportar.
Embora o aumento das exportações tenha sido forjado principalmente pela mudança do câmbio, outros fatos criaram ambiente favorável às exportações. As trocas de informações entre filiais de empresas multinacionais, com presença no Brasil, e as compras globais de matérias-primas (global sourcing) revelaram que a embalagem aqui produzida tem qualidade, tecnologia e preço muito competitivo.
Os preços competitivos devem-se principalmente à disponibilidade de quase todas as matérias-primas; além do mais, a energia brasileira não é cara em comparação aos países desenvolvidos, e a mão-de-obra ainda é barata. Por isso, o câmbio favorável criou situação, somada aos fatores anteriores, altamente competitiva. A indústria do vidro, a de melhor desempenho em 2003, foi impulsionada pela exportação. Trata-se de indústria pesada, intensiva em capital, com grandes capacidades e produções. Grande parte dos países não tem indústria de vidro de porte e o aumento de consumo interno dos principais produtores mundiais precisa ser suprido por importações, já que não há mobilidade para repentinos aumentos de capacidade – nessa brecha atua o País. O Brasil também tem exportado muitas tampas (inclusive com o desenvolvimento de patentes), principalmente de aço, com destaque para o PET.

A globalização do mercado brasileiro também colaborou. Dentre as 23 principais indústrias mundiais de embalagens, 22 operam no País. As empresas nacionais se beneficiam da presença dessas concorrentes estrangeiras, pois há intercâmbio de funcionários qualificados e com alto nível técnico, que circulam no mercado e ajudam na disseminação de conhecimentos no País. “Esse é um setor em que o Brasil não está atrasado, pois já alcançamos o nível internacional, com as principais tecnologias e tipos de embalagens usados no mundo disponíveis por aqui”, garante Mestriner.
As embalagens brasileiras também se benificiaram do crescimento do comércio exterior brasileiro em geral. No caso do agronegócio, aumentou o percentual da produção agrícola exportada já embalada, embora o valor absoluto ainda seja baixo, e o País, um grande exportador de commodities agrícolas sem qualquer valor agregado. “A agroindústria cresceu 7,5% ano passado e deve repetir a dose este ano. Quanto menos exportarmos a granel, e mais se exportar produto embalado, agregaremos valor e geraremos emprego no Brasil. Vendemos um produto a 120 dólares que depois é vendido por 15 mil dólares na ponta.
O Brasil precisa acordar para isso”, disse o presidente da Abre. Ainda mais, muitas das restrições fitossanitárias a produtos brasileiros inexistem no caso de produtos embalados. A carne enlatada, esterilizada, não enfrenta essas barreiras. Os produtos embalados se beneficiam de uma longa tradição de circulação mundial – enlatados, por exemplo, circulam há cerca de cem anos, e não há restrição.
Para agarrar essas oportunidades, no entanto, é preciso cultura empresarial voltada à exportação, algo novo entre o empresariado nacional. O conceito de global sourcing também é recente no mundo, resultado da globalização. Na busca por competitividade , o custo da embalagem, um dos mais importantes do produto, merece atenção. Há produtos em que a embalagem chega a ser mais cara que o conteúdo, caso da água mineral, de cosméticos e perfumaria, e produtos sujeitos à deterioração, como carne e o leite longa vida. Numa lata de ervilha, mais de 50% do custo final do produto é a embalagem. Por outro lado, embalar é a maneira mais simples de agregar valor a essas commodities agrícolas.
O peso da embalagem na composição do custo de um produto e a busca de maior competitividade impeliram as empresas às compras globais. Como as principais multis do planeta estão instaladas no Brasil (em todos os setores produtivos), é possível o acesso das matrizes às condições de fornecimento de embalagem no País. Além disso, é mais fácil para um fornecedor já credenciado em uma filial brasileira tornar-se fornecedor também em outras filiais.
Mas a Abre descobriu que o empresário brasileiro não sabe vender para o global sourcing, não há posição ativa em relação à oportunidade de negócios, e as ações em curso derivam de solicitações dos clientes multinacionais aqui instalados. Esse fornecimento requer adequação a normas, padrões e garantias internacionais (ausência de trabalho infantil e certificações ISO 14000 e 9000, por exemplo). Há também questões logísticas relacionadas a prazos rigorosos de entrega. “Mas não são demandas às quais empresas brasileiras não podem se adequar, é apenas algo novo, uma cultura nova”, crê Mestriner.
Detectados a oportunidade e os entraves, a Abre decidiu agir. A idéia é trazer alguns gerentes de compras e de global sourcing dessas multinacionais para a discussão com o comitê de exportação da Abre, que atua em questões semelhantes. O comitê está criando portal de exportação na internet (já existe modelo simples, que será melhorado) e mudou o enfoque dos estandes da Abre em feiras internacionais. Antes, o foco era realizar a presença institucional da embalagem brasileira nas feiras e apoiar os brasileiros que delas participavam, mas agora é vender a embalagem brasileira.
Além da participação em feiras internacionais de negócios, a associação formou um grupo exportador, composto por seis produtores de embalagens flexíveis (plásticos), incluindo Dixie Toga, Alcoa, Alcan, Embalagens Diadema, Converplast e Empax. Também foi assinado projeto de colaboração com a Agência de Promoção às Exportações, a Apex. E ainda há o objetivo de se atuar em todas as câmaras de comércio instaladas no País, bem como em consulados e embaixadas brasileiras, por meio dos adidos comerciais em todo o mundo.
A oportunidade do global sourcing contempla o mercado de embalagens em geral, pois há grandes indústrias de todos os setores aderindo ao procedimento. “O Brasil efetivamente tem chance de ser um player nesse negócio. Oportunidades surgem o tempo todo, mas a empresa brasileira precisa estar preparada para atuar nessas ocasiões”, enfatiza Mestriner. Afinal, não se pode ignorar um mercado internacional da ordem de US$ 500 bilhões.