Baterias íon-lítio e a Indústria Química – Insumos Químicos

As primeiras baterias recarregáveis de íon lítio (LIB) apareceram apenas por volta de 1990, mas já não se pode conceber o cotidiano sem elas.

Em 2012, a demanda mundial dessas baterias, representadas pelo seu uso em aparelhos eletrônicos portáteis, ferramentas elétricas e meios de locomoção leves, já chega a US$ 13 bi anuais, o que corresponde a cerca de US$ 3.9 bi de insumos-ânodos, eletrólitos, separadores, cátodos, e outros: coletores, ligantes, recipientes etc.

As inovações tecnológicas, daqui para frente, ficarão, sobretudo, por conta da penetração do mercado de propulsão automotiva – veículos híbridos (HEV) e exclusivamente elétricos (EV).

As exigências da indústria de automóveis, que traduzem as preocupações dos consumidores, correspondem a um conjunto de especificações e normas que por sua vez vão exigir o desenvolvimento de materiais diferenciados para os diversos componentes.

Até há algum tempo, o “carro elétrico” ainda era tratado mais como um brinquedo para ricaços californianos em busca de paz de consciência.

Mas o tom mudou: formou-se um novo consenso segundo o qual, para o horizonte 2035, HEV e EV terão apropriado uma fatia de uns 10% da demanda anual de novos veículos, representando US$ 20-25 bi anuais de baterias.

Química e Derivados, Albert Hahn, Posto de Escuta, Baterias íon-lítio e a indústria química
Carros Elétricos – Baterias – Baterias íon lítio

A isso se soma o mercado de baterias para armazenamento de energia de rede. Para os que acreditam no aumento da participação das diversas fontes intermitentes, cíclicas ou sazonais de energia elétrica, a demanda de baterias para armazenamento poderia alcançar umas cinco vezes a do mercado de propulsão.

Química e Derivados, Albert Hahn, Posto de Escuta, Baterias íon-lítio e a indústria química
Mercado Mundial de Baterias Íon Lítio

Insumos químicos

• Cátodos

Os cátodos para LIB são materiais cerâmicos-óxidos capazes de perder de forma reversível o íon de lítio contido, a propriedade que os torna regeneráveis.

Existem três famílias principais:

Óxidos de cobalto, em forma de lamelas, quer a 100% (LCO), obtidos por substituição parcial do Co por outros metais de transição de menor desempenho e custo como Ni e Mn (NMC), e às vezes contendo também um pouco de alumínio (NCA). A propriedade dos metais principais é sua facilidade de passar da valência +2 para +3 e vice-versa.

Sistemas cristalinos do tipo espinélio, contendo Li e Mn (LMO).

Sistemas cristalinos do tipo olivina, contendo Li e Fe (LFP), cujo principal atrativo é a segurança.

Os produtores de óxidos mistos (NMC/NCA) são licenciados do Argonne National Laboratory. As patentes da base para o LFP, para o qual se espera um crescimento espetacular, são da canadense Quebec Hydro, e a tecnologia (produção, revestimentos, dopantes etc.) é licenciada por uma subsidiária da Clariant. A reação se dá sob temperatura elevada e em atmosfera redutora. Segundo as projeções de demandas, não é surpresa já se poder constatar a existência de considerável produção extrapatente (China, Rússia).

A demanda total de cátodos deverá continuar crescendo a 18.5% por ano, e a do LFP a 32.5% por ano.

Química e Derivados, Albert Hahn, Posto de Escuta, Baterias íon-lítio e a indústria química
Tipos de Cátodo – Baterias

 

• Ânodos

A característica-chave do ânodo é a sua capacidade de armazenar íons de lítio durante a fase da carga.

O material de referência para essa aplicação é o grafite, uma das formas cristalinas do carbono.

Parte-se do grafite natural, em escamas, que é submetido a várias operações: moagem/micronização, peneiramento, purificação (térmica ou química), revestimento e reação com vapor.

Os objetivos: obter um material de 99.9% de pureza, e de elevada superfície específica. A formulação pode conter, como aditivos, materiais sintéticos, a exemplo das MCMBs (microesferas de meso-carbono) obtidas de um piche, de alcatrão ou de coque, as quais melhoram a condutividade e as propriedades mecânicas da composição.

O ânodo também contém uma parte do Li total.

Para ultrapassar as limitações de capacidade do carbono, foi desencadeada uma corrida para desenvolver ânodos feitos com o seu vizinho de tabela periódica, o silício.

A capacidade específica teórica do Si é cerca de dez vezes (na prática, fala-se em cinco) superior, mas ao incorporar os íons Li+ o material tende a se expandir, deformar, e se tornar inutilizado após alguns poucos ciclos de carga/descarga.

A maioria das propostas envolve nanotecnologia: silício metálico na forma de nanopartículas incluídas em uma matriz de sílica (Hitachi), ou de nanofibras. A Nexeon (RU) trabalha com nanotecnologia desenvolvida no Imperial College, a qual inclui uma etapa de tratamento com ácido fluorídrico.

E, além do silício, há interesse em materiais cerâmicos derivados do titânio como o titanato Li4Ti5O12, na forma de compósitos com material carbonáceo.

• Eletrólitos

Os eletrólitos são soluções orgânicas (1.0 a 1.2 mol) de um sal de lítio. O eletrólito precisa reunir qualidades de solvência, estabilidade, durabilidade, ampla faixa de temperatura operacional, viscosidade (para facilitar a embebição no separador), e permitir a maior estabilidade eletroquímica possível. O solvente principal costuma ser o carbonato de etila (EC).

Outros ingredientes do coquetel são:

  • Um redutor de viscosidade, em geral, um dicarbonato linear (metila ou etila);
  • Um cosolvente (para reduzir o ponto de fusão), geralmente um acetal- dimetoxi (ou etoxi) etano – e/ou o THF;
  • Um redutor de flamabilidade, por exemplo, o carbonato de vinileno.

A maioria desses componentes faz parte das árvores químicas C1/C2.

O sal de lítio mais empregado é o hexafluorofosfato de lítio (LiPF6), que dissolve bem e anda caindo de preço.

É produzido com o pentafluoreto de fósforo. Em algumas formulações, uma parte do LFP é substituída pelo LiBOB.

Química e Derivados, Albert Hahn, Posto de Escuta, Baterias íon-lítio e a indústria química

A flamabilidade dos eletrólitos líquidos exclui sua aplicação para propulsão automotiva. Possíveis alternativas seriam sistemas baseados em RTIL (líquidos aniônicos sob temperatura ambiente) aos quais o lítio é incorporado na forma de LiTFSI.

Química e Derivados, Albert Hahn, Posto de Escuta, Baterias íon-lítio e a indústria química

A Solvay anunciou que vai produzir esse composto em sua unidade fluoroquímica de Salindres, na França (onde também produz o precursor, o ácido tríflico).

Para os EVs, fala-se, sobretudo, em eletrólitos poliméricos à base de um polióxido de eteno, de peso molecular em torno de 4 MM.

Principais Insumos para Baterias Íon Litío

Química e Derivados, Albert Hahn, Posto de Escuta, Baterias íon-lítio e a indústria química
Principais Insumos para Baterias Íon Lítio

 

Separadores

Os eletrólitos líquidos são embebidos em material microporoso, geralmente um filme poliolefínico, biorientado (para a criação dos poros) de uns 20 mícrons de espessura. Nas baterias para EV, de maior capacidade, que empregam eletrólitos poliméricos, os separadores serão filmes mais finos, feitos com um fluoropolímero (PVDF).

Existem duas famílias tecnológicas para a obtenção do filme poliolefínico:

processos por via seca (extrusão/orientação), e por via úmida (dissolução/deposição/evaporação e recuperação do solvente/orientação).

Os processos úmidos permitem a obtenção de filmes mais finos, mas exigem investimentos bem mais elevados.

• Outros componentes

Entre os outros insumos, pode-se mencionar:

  • O condutor do cátodo, em geral, uma folha de Al de 20 µm obtida por laminação;
  • O condutor do ânodo, uma folha de Cu de 14 µm produzida por eletrodeposição;
  • Ligantes (PVDF, CMC);
  • Negro de acetileno (para melhorar a condutividade do cátodo).

Além do desenvolvimento de novos ou melhores materiais ativos, existe também muito trabalho de pesquisa para diminuir o custo da fabricação da bateria: redução de participação dos componentes inertes no peso/volume do produto final, melhoria do fluxograma de montagem do produto final, procedimentos mais eficientes de carga e de CQ e principalmente aumento da segurança.

Oportunidades

Tomando como horizonte o ano 2035, as baterias de íon de lítio estarão representando um mercado para a indústria química – sentido amplo – de uns US$ 15 bi anuais, correspondendo a 550.000 t de materiais. Mas para a indústria química brasileira, esse ainda tem cara de baile para o qual não fomos convidados.

Com base no custo médio dos componentes, de uns US$ 28/kg, dá para ver que as várias indústrias produtoras de insumos podem ser consideradas exemplos de “química fina pesada”. Alguns setores utilizam matérias-primas que existem no Brasil, mas envolvem etapas industriais cujo forte valor agregado é consequência de investimentos elevados, inclusive em propriedade intelectual.

Fluoroquímica

as duas plantas de HF que existiam no Brasil foram desativadas. Fala-se na possibilidade de produção com o ácido fluossilícico (subproduto indesejável da produção de ácido fosfórico), mas seria apenas uma “condição necessária”. A fluoroquímica de elevado valor agregado está presente nos sais do eletrólito, em separadores e como ligante dos eletrodos.

Cerâmica fina

Este é um setor em que haveria no Brasil uma certa base: um leque diversificado de matérias-primas minerais, uma indústria de transformação (refratários, insumos cerâmicos) de grande porte.

Ânodos de grafite

O Brasil já é exportador importante de grafite natural; a C.N. Grafite é o segundo maior produtor do mundo.

Essa presença será ampliada quando entrar em produção o projeto de 40 mil t/ano da Magnesita, em MG. Mas, ao longo da cadeia de valor, encontram-se os grandes especialistas mundiais do beneficiamento de materiais carbonáceos, e o valor final acaba multiplicado por dez a 20 vezes o valor das matérias-primas carbonáceas.

A China representa 80% da extração de grafite natural em escamas, e há receios de que o país passe a adotar uma estratégia comercial parecida com sua bem conhecida postura em relação às terras raras e à fluorita; e isso pode significar oportunidades para o Brasil.

Nanoderivados do silício

Supondo uma substituição de 10%-15% do total de grafite empregado, em 2035 essa poderá vir a ser uma indústria de umas 2.000-3.000 t/ano no mundo, no valor de até US$ 300 milhões. O Brasil é produtor de metal silício.

Quanto ao próprio lítio, a produção mundial anda em torno de 120 mil t/ano de LCE (carbonato de lítio equivalente); e, para 2035, a previsão é de um incremento de 200-250 mil t/ano.

Química e Derivados, Albert Hahn, Posto de Escuta, Baterias íon-lítio e a indústria química
Carbonato de Lítio – Principais Produtores Mundiais

Existem duas fontes de lítio:

• Os evaporitos dos salares de Atacama (Chile) e HombreMuerto (perto de Salta, na Argentina).

Os depósitos chilenos da SQM, os mais ricos, contêm 14% de Li. Trata-se de salmouras subterrâneas das quais se recupera, por bombeamento e um longo processo de evaporação, cloretos de lítio e potássio.

• Pegmatitos, rochas que contêm até 50% – caso da excepcional jazida de Greenbushes, na Austrália – de espodumênio (um silicato de Al e Li), em mistura com feldspato e quartzo.

O minério explorado pela Cia. Brasileira de Lítio contém 20% de espodumênio, teor parecido com o da maioria das demais jazidas comerciais em exploração (Canadá etc.). A China produz sobretudo com concentrados australianos.

A maior reserva de lítio do mundo é a do salar de Uyuni, na Bolívia, mas seu teor é de apenas 05%. Um fluxograma de recuperação foi desenvolvido em conjunto com a siderúrgica coreana Posco.

Estuda-se, há algum tempo, um projeto de coprodução Li/K em que o carbonato de lítio representaria uns 40% do faturamento.

O lítio de salar custa menos para extrair, porém, dada a presença de Mg, B e outros contaminantes, é mais difícil de purificar até as especificações dos fabricantes de baterias. Daí o número de novos projetos (Canadá, Austrália) com o espodumênio.

As capacidades unitárias dos novos projetos anunciados giram em torno de 20-25 mil t/ano LCE; a esse nível os investimentos são da ordem de US$ 15/kg anual (mina e planta) para a produção com rocha, e US$ 9-10/kg para lítio de salar.

Estima-se a vantagem de custo dos produtores do Atacama (incluindo retorno sobre o investimento) em quase US$ 3/kg de LCE. O único produtor brasileiro, C. B. Lítio, tem uma capacidade de quase 1.000 t/ano. A política brasileira em relação ao lítio é determinada pelo CNEN.

Parte da demanda incremental será atendida por desgargalamentos, outra, futuramente, por intermédio da reciclagem de baterias. O tamanho médio mundial dos meios de transporte individual poderá diminuir. E sempre haverá a promessa da jazida boliviana, com suas reservas de 10 milhões t de lítio.

Na falta de fabricantes locais de baterias – essa indústria ainda está praticamente toda concentrada na Ásia –, as economias atlânticas formaram redes de competência cuja missão pode ser vista como a de “não deixar cair a peteca tecnológica”.

Nos EUA existe uma rede formada pelos Centros de Pesquisa das Fronteiras Energéticas, umas 50 instituições, todas apoiadas pelo Ministério da Energia. Na Comunidade Europeia foi formada a rede Alistore ERI composta de 21 laboratórios associados, financiados por empresas privadas.

No Brasil, sob a égide do MCTI, foi criado um grupo PDT Lítio que será coordenado pela Unesc (Santa Catarina), e entre cujos membros estão o Cetem (Centro de Tecnologia Mineral, do Rio de Janeiro) e o CPqD, de Campinas, SP.

Leia Mais:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.