Ambiente: Incineração de clorados aguarda decisão judicial

Uma montanha de big bags contendo 2.700 toneladas de terra, solo contaminado da fábrica desativada da Rhodia, em Cubatão-SP, aguarda na Cetrel, empresa de proteção ambiental do 2º Pólo Petroquímico, na Bahia, a derrubada da liminar que impediu a incineração quando cerca de 900 t já haviam sido incineradas e todo o estoque já havia sido transportado de São Paulo. O solo, que permaneceu confinado por mais de dez anos em uma estação de espera em São Vicente-SP, está contaminado por hexaclorobutadieno, tetraclorobenzeno, pentaclorofenol, hexaclorobenzeno e derivados da produção de solventes clorados.

Nesta questão, embora a eficácia da incineração seja questionada, o foco parece ser a procedência paulista do resíduo, a “imundície química” que, segundo o presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa, deputado petista Zilton Rocha, “São Paulo mandou para a Bahia, arriscando também a vida de milhares de pessoas” nos mais de 2 mil quilômetros rodoviários percorridos pela carga entre os dois Estados. Foi o deputado quem impetrou a ação popular, com pedido de liminar para suspender o transporte e a incineração.

Foi uma ONG sediada em São Paulo, a Associação de Combate aos Poluentes Orgânicos Persistentes (ACPO) que alertou os baianos “para o malefício dos resíduos cancerígenos, mutagênicos e teratogênicos” que estavam chegando, nos termos de contrato comercial Rhodia-Cetrel que estabelece prazo de dois anos para a incineração. O solo chegou com três certificados de aprovação e destinação de resíduos industriais emitidos pela Cetesb.

Antes de a liminar com efeito suspensivo ser deferida houve muito alvoroço e audiência na OAB com discussão aberta. A Procuradoria da República e as representações federal e estadual do Ministério Público haviam recomendado a suspensão imediata do transporte e da incineração.

Para tentar derrubar a liminar, a Comissão de Recursos Ambientais (CRA), que executa na Bahia as determinações do Conselho Estadual de Proteção do Meio Ambiente, sustenta que a incineração foi autorizada com base em estudos técnicos e em total observância à legislação ambiental. “A Cetrel é licenciada, tem condições de fazer o tratamento”, assegura o diretor de Controle Ambiental, Ney Maron. A licença, na opinião dele, prevê a realização periódica de testes da eficiência de destruição dos principais produtos orgânicos perigosos e os resultados sempre demonstram a boa performance do incinerador.

“A incineração é procedimento utilizado no mundo inteiro para tratar resíduos perigosos, apresenta taxas de destruição igual ou superior a 99,99 % para os principais poluentes orgânicos perigosos”, esclareceu publicamente o CRA. “Após a destruição dos componentes perigosos na incineração, o resíduo final estará enquadrado como classe 2, do tipo não perigoso”.

Mas por que o solo contaminado está sendo incinerado na Bahia e não em São Paulo? A Justiça teria impedido a incineração em São Paulo para não ofender a legislação estadual que limita a emissão máxima para a atmosfera em 0,14 ng/m3 de dioxinas e furanos, taxa de destruição essa que a empresa incineradora contratada na ocasião pela Rhodia, em São Paulo, não alcançaria. A alternativa foi contratar a Cetrel.

A taxa de destruição alcançada na Cetrel, revela o engenheiro do CRA Francisco Brito, atenderia duas vezes a exigência da legislação de São Paulo, pois reduz a emissão a 0,07 ng/m3. “É o que vai medido para a atmosfera, e bem medido, depois de o solo contaminado passar, a uma temperatura de até 1.250 graus, pela câmara rotativa de incineração, pós-queima, despoeiramento, lavagens dos gases, ciclones e filtros”, atesta detalhadamente, ressaltando a tecnologia. Com essa tecnologia, desde 1991 foram incineradas na Cetrel, “sem nenhuma controvérsia”, 140 mil t de resíduos sólidos da classe 1, incluindo um dos mais amaldiçoados pelos ambientalistas, o ascarel. “Não é transferência de passivo ambiental, é solução”.

A eficácia da Cetrel, embora atestada pela CRA, não pacificou a questão porque a argumentação logo ficou em segundo plano em relação a outra constatação confusamente alardeada de que na Bahia a legislação seria complacente, mais tolerante do que a de São Paulo. Essa situação, acusaram os ambientalistas, teria beneficiado a Cetrel no propósito de assegurar um negócio banido de São Paulo, onde ao contrário da Bahia a questão ambiental já estaria sendo tratada de acordo com parâmetros mais atualizados ou adequados.

Na verdade, Bahia não tem legislação ambientalista própria, situação que põe o Estado, obrigatoriamente, na contingência de seguir as resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), bem menos restritivas em relação à legislação de São Paulo. A Resolução Conama 316.02 permite que a taxa de destruição de resíduos da classe 1 seja de até 0,50 ng/m3. É, portanto, 257% mais tolerante do que a de São Paulo. “Se a Bahia optasse por estabelecer legislação própria, como fez São Paulo, a legislação teria de ser mais restritiva do que à do Conama; não poderia ser menos”, esclarece Francisco Brito. “Mas na Cetrel a eficácia da incineração atende ambas as legislações”.

“São Paulo, onde esse lixo tóxico foi produzido, proibiu a incineração em seu território porque não há segurança nesta técnica”, bradou publicamente o deputado ambientalista Zilton Rocha. Indagado por Química e Derivados sobre qual seria a alternativa àincineração, o deputado respondeu que não era químico e completou: “O que eu quis mesmo foi impedir o transporte deste material poluído para a Bahia, mas como já estava todo aqui, que fosse suspensa a incineração a fim de evitar a contaminação do meio ambiente e outros danos”.

Em meio ao tiroteio, a justiça deferiu o mandado de segurança, com base no princípio da precaução, presente na Constituição e na Lei dos Crimes Ambientais.

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